Folha de S. Paulo


Chavistas convocam até miss para festejar mandato sem presidente

Hugo Chávez começa a cantar, com voz potente, o hino da Venezuela, e uma multidão nos arredores do palácio presidencial em Caracas canta junto. Tudo transmitido em cadeia nacional de rádio e TV.

A voz do presidente é, porém, apenas uma gravação.

Convalescente em Cuba, Chávez não participa da festa montada em sua homenagem nesta quinta-feira na capital do país, espécie de blindagem popular para a decisão do governo, chancelada pela Justiça, que adia, sem nova data, a cerimônia de posse do novo mandato presidencial prevista para hoje.

O lema da mobilização é "#YoSoyChávez" (Eu sou Chávez), estampado em camisetas distribuídas pelo governo, e #YomeJuramentoconChávez ("eu juro com Chávez", em espanhol).

"Enquanto Chávez estiver vivo será nosso presidente. É assim que deve ser", diz Dulis Méndez, 52, que viajou mais de dez horas para chegar a Caracas para a festa. "O presidente somos todos nós. Chávez manda obedecendo o povo", diz Méndez, que veio num ônibus pago pelo partido chavista, ecoando palavras frequentes do presidente.

Num palco, músicos locais e a venezuelana Ivian Sarcos, Miss Mundo 2011, que saúda a multidão, dá uma voltinha e é aplaudida efusivamente. Ao lado deles, representantes dos governos vizinhos, entre eles o chanceler argentino Héctor Timerman, que foi o primeiro a falar.

Os presidentes José Mujica (Uruguai), Evo Morales (Bolívia), Daniel Ortega (Nicarágua), o ex-presidente do Paraguai Fernando Lugo e altos funcionários de vários países pertencentes à Petrocaribe, a iniciativa venezuelana que vende petróleo a preços subsidiados a países pobres, especialmente do Caribe, também participam do ato.

IMBRÓGLIO

Nesta quarta (9), o Tribunal Supremo de Justiça, a principal corte do país, chancelou o adiamento indefinido da posse de Chávez. Desta forma, os magistrados ratificaram a visão chavista de que a cerimônia de posse é uma formalidade sem data estipulada na Constituição. A data firmada pela Constituição, 10 de janeiro, vale só para a cerimônia no Legislativo --posteriormente, a posse ocorre ante do TSJ.

Para os magistrados, a posse pode ser adiada porque é o próprio Chávez quem encabeça o próximo mandato. Há também continuidade administrativa e o vice-presidente, Nicolás Maduro, seguirá no cargo, assim como os demais ministros.

A oposição rejeita energicamente a interpretação, que classifica de "grave violação da ordem constitucional". Dizem que a leitura do artigo 231 é casuística e que o mandato de Chávez 2007-2013 termina hoje e que amanhã o presidente da Assembleia Nacional deve assumir interinamente o poder.

O argumento é que o posto, ocupado pelo chavista Diosdado Cabello, é o primeiro eleito por voto direto depois de Chávez. Questionam especialmente a legitimidade de Maduro seguir no posto atual a partir de amanhã.

À diferença do Brasil, o vice não faz parte da chapa eleitoral. É um cargo de livre nomeação pelo presidente que teria de ser validado, na leitura dos antichavistas, para o próximo período constitucional.


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