Folha de S. Paulo


Multinacionais não se adaptam a novo gosto chinês

As marcas internacionais estão encontrando dificuldade para se adaptar aos novos gostos dos consumidores chineses e estão perdendo participação de mercado para companhias locais em produtos de uso diário que variam de sucos de frutas e maquiagem a escovas de dente.

Os chineses de classe média e alta, cuja renda está crescendo, estão adotando marcas mais caras e luxuosas nas categorias de bens de consumo de uso rápido, como água mineral, suco e xampu. Até o papel higiênico de folha dupla está sendo trocado pelo de folha tripla.

Mas as empresas chinesas estão agindo mais rápido na captura do segmento mais alto do mercado, e marcas controladas por múltis como Nestlé, Procter & Gamble e Unilever perderam mercado em 18 das 26 categorias de produtos de consumo de uso rápido.

Esse mercado cresceu 3% na China em 2016, movimentando US$ 190 bilhões, mas as empresas locais expandiram as vendas em mais de 8%, enquanto as marcas estrangeiras cresceram 1,5%.

"As marcas multinacionais estão regredindo, e as marcas nacionais estão se saindo muito bem na conversão a um mercado premium", disse Jason Wu, gerente da Kantar Worldpanel China, que realizou pesquisa sobre o tema.

A transição rumo a marcas nacionais foi mais pronunciada em categorias tradicionalmente dominadas por empresas estrangeiras, como os cosméticos. O agente da mudança foram empresas chinesas pouco conhecidas como a Seeyoung, que lançou um xampu sem silicone antes que suas rivais internacionais fizessem o mesmo.

No mercado de sucos, empresas locais como a Huiyuan e a Nongfu obtiveram sucesso com sucos caros, produzidos diretamente da fruta, e não de concentrados, e vendidos como bebidas de saúde, o que caiu no gosto da classe média do país, cada vez mais interessada em condicionamento físico.

Os participantes nacionais também se beneficiaram do maior volume de compras on-line, que responderam por três quartos do avanço de volume no ano passado.

"As marcas locais estão se movendo rápido nessa área e adotam o comércio eletrônico muito mais rápido que as multinacionais", disse Wu.

As companhias chinesas de bens de consumo, em geral empresas sob controle familiar, têm foco mais estreito em seu mercado de origem, mas podem ser "tão inovadoras ou mais inovadoras do que as empresas ocidentais", enquanto as multinacionais "estão perto de se tornar ou já se tornaram burocracias", disse Bruno Lannes, sócio da consultoria Bain.

Shaun Reid, da consultoria China Market Research Group, afirmou que a Nestlé ficou para trás no mercado chinês de água mineral porque posicionou sua oferta abaixo das marcas de rivais locais no mercado. Já o principal sorvete da Unilever é considerado "pequeno demais e barato demais".

"Eles queriam ser um produto médio na China, mas, por causa da qualidade, as pessoas estavam dispostas a pagar mais por marcas estrangeiras", disse Reid.

As divisões de bens de consumo das multinacionais podem ser prejudicadas por sua estrutura hierárquica, com decisões-chave tomadas fora da China, ele acrescentou. "O poder tende a estar na Europa ou nos Estados Unidos."

Mas nem todas as notícias foram ruins para as multinacionais no mercado chinês.

Elas ganharam mercado na cerveja, em que as marcas chinesas têm tido dificuldades para deixar para trás sua imagem de produtos baratos.

Algumas marcas individuais de alto preço se saíram bem no país asiático, a exemplo de cosméticos com as marcas Armani e YSL. E a Philips viu aumentar as vendas de suas escovas de dente elétricas, porque a busca por produtos premium chegou ao mercado de higiene oral.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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