Folha de S. Paulo


Congelar o programa Bolsa Família foi erro, diz economista do FGV Social

A queda da renda entre os 10% mais pobres, verificada na Pnad, aumentou a pobreza no país em quase 20%, segundo o economista Marcelo Neri, 53, pesquisador e diretor do FGV Social.

Nos anos dourados do crescimento, Neri criou a expressão "nova classe média", para ilustrar a ascensão da renda dos mais pobres. Agora, lamenta "erros", que segundo ele foram cometidos no último ano da gestão de Dilma Rousseff, que afetaram justamente a base da pirâmide.

Folha - Como avalia os dados da Pnad?

Marcelo Neri - Revelam que 2015 foi um ano duplamente ruim. A renda familiar per capita caiu 7,04%. De 2004 a 2014, ela crescia em média 4,5%. A pobreza também aumentou muito: 19,33%. De 2004 a 2014, ela havia caído em média 10,44% ao ano.

Por que a pobreza aumentou?

Uma parte importante é explicada pelo congelamento do Bolsa Família com a inflação em dois dígitos. Nenhum outro benefício foi congelado assim. E ele vai de fato para os 10% mais pobres. E aí há uma quebra da série da história: é a primeira alta da pobreza desde a recessão de 2003.

O que os números de 2016 sugerem que vá aparecer nas estatísticas?

A partir da Pnad Contínua [pesquisa mensal sobre emprego], é possível notar que a renda do trabalho continua a cair de maneira forte e a desigualdade [entre as pessoas ocupadas] aumentou.

Em 2015, a série de rendimento tem um baque, e a série de desigualdade surpreendentemente, não.

Ou seja, essa estabilidade da desigualdade não vai ficar, vamos perdê-la em 2016.

Vamos perder tudo de bom das grandes tendências que tivemos desde o fim da última recessão, no governo Lula, até 2014.

PNAD - Renda

Surpreende o fato de a desigualdade ter caído em 2015, apesar da recessão?

É notável o fato de ela não ter aumentado. Em parte é um excelente resultado, porque normalmente as recessões afetam os mais pobres. Mas na verdade houve uma perda generalizada.

Por que o piso da distribuição, os 10% mais pobres, foi mais afetado?

Houve um tratamento diferenciado, no mau sentido, dado aos mais pobres em 2015. O salário mínimo, a Previdência, o seguro-desemprego, todos aumentaram em 2015, e o Bolsa Família ficou parado.

Foi uma iniciativa totalmente sem sentido o aumento do salário mínimo. Não só ele gerou um impacto muito forte nas contas públicas como ajudou a aumentar o desemprego e a desocupação.

Erramos ao não reajustar o Bolsa Família. Fez com que colhêssemos esse resultado na pobreza visto na Pnad.


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