Folha de S. Paulo


Empreendedores e gerentes são diferentes, afirma dono da WPP

Neil Hall/AP
Martin Sorrell, Chairman and Chief Executive Officer of advertising and marketing company WPP, attends The Times CEO Summit in London, Tuesday June 28, 2016. The annual event hosted by The Times of London attracts political leaders along with business executives. (Neil Hall/ Pool via AP) ORG XMIT: LON117
Martin Sorrell, fundador e principal executivo da WPP, durante evento em Londres

Um assunto é especialmente sensível para Martin Sorrell: o questionamento ao que recebe como principal executivo da WPP, maior grupo de publicidade do mundo.

No ano passado, foram US$ 103 milhões (R$ 328 milhões), um dos pagamentos mais altos do mundo corporativo, valor que desagradou a uma parte dos acionistas da empresa.

Ao rebater as críticas, Sorrell aponta a diferença que enxerga entre empreendedores e gerentes.

*

Folha - O sr. foi questionado pelo que recebeu como executivo. O que pensou sobre isso?
Martin Sorrell - Eu comecei a WPP com duas pessoas, eu e mais uma, em 1985, num porão de Londres. Era uma negócio de manufatura na Bolsa de Valores, que valia US$ 1,5 milhão e hoje vale US$ 30 bilhões. Eu não vou pedir desculpas por isso.

Toda a minha riqueza está na empresa. Investi dinheiro no negócio, fiz isso no começo e diversas vezes. Eu me divorciei cerca de dez anos atrás e tive que vender ações, mas foi isso em 31 anos. Estou totalmente comprometido com o negócio, todo o meu dinheiro. Tenho uma pequena casa em José Ignacio, no Uruguai, é verdade. Nada esbanjador, uma pequena casa. Não tenho um museu ou uma grande coleção de arte. 95% do meu dinheiro está na empresa e tem estado lá por 31 anos.

Outra coisa é que empregamos 190 mil pessoas. Vamos dizer que sejam 200 mil e vamos assumir que cada unidade familiar tem três pessoas. Isso significa que 600 mil pessoas dependem da empresa. Isso é bom. No Reino Unido, nos últimos quatro anos, fomos de 12 mil para 16.500 pessoas, num momento em que a economia britânica esteve ok, mas não brilhante. Então não vou pedir nenhuma desculpa por isso.

Editoria de Arte/Folhapress
Fichas entrevista com Martin Sorrell

Esse tipo de crítica a empreendedores, isso lhe surpreende?
Em alguns países, eles gostam de jogar você para baixo. É inveja, ou como quiser chamar. Nos EUA creio que é verdadeiro que as pessoas celebram o sucesso. Em certa medida, é isso que Donald Trump [empresário candidato à presidência dos EUA] representa. Você pode argumentar se Trump tem tanto sucesso quanto ele diz que tem. Ele afirma que é ótimo, fabuloso, fantástico etc. Podemos discutir se ele é tão fantástico assim. Mas o fato é que nos EUA as pessoas festejam o sucesso.

Quando você falha nos EUA você não é rotulado. Donald Trump quebrou quatro vezes e deu a volta por cima. Mas em alguns países, se você falha, você é rotulado, marcado como gado.

Creio que há uma diferença muito grande aí. Há pessoas que começam negócios, que você chama de empreendedores, o que significa tomar risco, e gerentes. Não estou dizendo que gerentes são uma coisa ruim, eles são uma coisa boa. Mas são diferentes. Nosso negócio funciona 24/7. Com clientes você não pode ir dormir. Não há Natal. Você está sempre de pé. Isso é uma coisa.

A outra coisa, havia um técnico famoso na Inglaterra chamado Bill Shankly. Era treinador do Liverpool, nos tempos em que o Liverpool era realmente bom. Era como um Alex Ferguson dos anos 1970. Ele dizia –isso é bom para o Brasil– o futebol não é uma questão de vida ou morte, é mais importante do que isso. Então a WPP não é uma questão de vida ou morte, é mais importante do que isso. É uma atitude diferente.

Gerentes não são ruins, não estou dizendo que são ruins, são apenas diferentes. Se você começa um negócio, essa é outra analogia, isso é o mais próximo que você pode chegar de ter um bebê. Não fisicamente, mas mentalmente. Porque se você começa algo, você está totalmente comprometido com isso. Voltando à questão da compensação: as pessoas têm que entender essa diferença. Se não entenderem isso, é usar as regras dos gerentes, você destrói os empreendedores. Ou vocês os destrói ou eles vão para outro lugar.

Eu realmente acho que esse é um grande risco, um problema real. Você não pode aplicar as mesmas regras para todas as situações. Se fizer isso, fica com o mínimo denominador comum, não com o máximo múltiplo comum. O que você deveria estar buscando é o máximo múltiplo comum.

Editoria de Arte/Folhapress
Fichas entrevista com Martin Sorrell

Eu me sinto realmente obcecado por isso. Faço isso há 31 anos. A vida média de um presidente-executivo é de seis ou sete anos, nos EUA e no Reino Unido. Eu assumi um compromisso de longo prazo. Não é que estou chegando, tomando opções [de ações] e vendendo em dois anos por um lucro gordo. Se as ações sobem, eu me dou bem. Se caem, eu morro. A coisa ruim é que você não recebe crédito por isso.

Warren Buffet escreveu 20 anos atrás: você não daria uma opção a uma instituição a custo zero, então por que faz isso com os gerentes? Por que quando você dá opções aos gerentes, o tempo para exercê-las é usualmente de dez anos, com custo zero. Você não faria isso com uma instituição a menos que cobrasse pelo dinheiro, então por que faz isso com os gerentes? Eu comecei isso há 31 anos, tivemos altos e baixos. Tivemos três recessões.

Claro que fico sensível em relação a isso, provavelmente falei mais aqui do que jamais havia dito a qualquer pessoa. Mas estou muito seguro nesse aspecto. O problema é que você é levado ao menor denominador comum. E o que isso significa? Vai levar as pessoas a negócios privados, para o private equity [gestoras de fundos que compram participações em empresas]. É isso o que vai acontecer.

O que não é bom para a sociedade.
O que o private equity faz é tirar o negócio do mercado, comprar as empresas para fora dele, gastar cinco anos consertando-o, usualmente com muito corte de pessoal, para então vendê-lo de volta, cinco anos depois pelo valor que foi pago. É uma loucura.


Endereço da página: