A Polícia Federal realizou nesta quinta-feira (16) ação para desarticular uma quadrilha que movimentava R$ 3 bilhões ao ano em mercadorias contrabandeadas em vários Estados do país —a maioria eletrônicos, como notebooks e componentes elétricos, além de medicamentos e hormônios cuja venda é proibida no Brasil.
Investigadores afirmam que o grupo atuava havia "pelo menos uma década", e tinha uma frota de 12 aeronaves que voavam de Salto Del Guairá, no Paraguai, onde faziam o carregamento, até o interior de São Paulo.
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Os aviões pousavam em pistas clandestinas escondidas em meio a canaviais e fazendas na região de Ribeirão Preto.
"Eles operavam diariamente, com até dois voos por dia, inclusive em finais de semana e feriados", diz o delegado federal Alexander Noronha Dias, coordenador da operação. "Tinham um poder financeiro muito grande."
A chamada Operação Celeno iria cumprir 138 mandados judiciais em São Paulo, Paraná, Espírito Santo e Minas Gerais —sendo 28 de prisão preventiva, 15 de prisão temporária, 18 de condução coercitiva e 77 de busca e apreensão. A polícia ainda não divulgou o balanço da ação.
Proprietários de aeronaves, pilotos, agenciadores (que contratavam o frete aéreo) e clientes finais, além de funcionários que faziam o descarregamento da mercadoria, estão entre os alvos.
Alguns dos presos já eram conhecidos da PF: um deles foi detido numa operação em 2007, outros haviam sido presos em flagrantes anteriores. "Como a pena para descaminho é pequena, eles pagavam fiança, respondiam em liberdade, readquiriam as aeronaves apreendidas em leilão e voltavam a operar", diz Dias.
A expectativa, agora, é conseguir deter os criminosos por mais tempo na prisão, já que eles também devem responder por organização criminosa.
ORIGENS
A PF começou a investigar a quadrilha em 2013.
Cada aeronave usada pelo grupo tinha os assentos dos passageiros removidos, e carregava 600 quilos de mercadorias, em valor estimado de US$ 500 mil.
Nas pistas, uma equipe logística descarregava o contrabando, transportava por caminhões e veículos e o revendia a lojas de departamento e de informática, algumas de escala nacional. Essas empresas ainda estão sob investigação da PF, que quer saber se elas tinham conhecimento da origem ilícita da mercadoria.
A região de Ribeirão Preto, onde boa parte da quadrilha se concentrava, faz parte da chamada "rota caipira" do tráfico. Há 16 anos, a CPI do Narcotráfico investigou a existência de 69 pistas de pouso clandestinas em 26 cidades da região, muitas delas em meio a lavouras de cana-de-açúcar. Em todo o Estado, eram 360. Uma das características desses aviões é tentar voos a baixa altitude, com o objetivo de fugir de radares.
Os grupos eram contratados por agenciadores baseados em Foz do Iguaçu (PR) e no Paraguai.
Um casal que fornecia as mercadorias no Paraguai também é investigado pela PF, que pretende pedir colaboração à Interpol para cumprir mandados de prisão no país.
O nome da operação remete à mitologia grega. Celeno é uma harpia, um monstro mitológico. O nome também tem significado de "obscuro" ou "escuridão".
Com ESTELITA HASS CARAZZAI e MARCELO TOLEDO
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CRIME SEM CASTIGO
A Folha acompanhou por dois meses os caminhos e os impactos do comércio ilícito e do contrabando no Brasil.