Folha de S. Paulo


Recuperação de 'crédito podre' ganha fôlego no Brasil

Foi vasculhando as redes sociais que os executivos da Jive, firma paulista especializada em recuperação de crédito, conseguiram encontrar o que há anos um devedor negava existir: dinheiro.

O empresário devia mais de R$ 40 milhões e jurava não ter de onde tirar. Seus filhos, no entanto, publicavam no Instagram fotos de passeios de lancha em Angra dos Reis, balneário famoso por reunir endinheirados do eixo Rio-SP.

Atrás da pista, a Jive identificou que a lancha estava em nome de uma empresa no Uruguai, cujo representante era advogado do devedor. Em Angra, o marinheiro da lancha disse que o caloteiro em questão era seu patrão.

Editoria de Arte/Folhapress

Empresas como a Jive, que se dedicam a caçar devedores, devem ter mais trabalho daqui para frente. O mercado de venda de "créditos podres" avança no país.

Itaú, Bradesco e Caixa iniciaram o ano com planos de passar à frente carteiras que somam bilhões em créditos não pagos por seus clientes.

Segundo apurou a Folha, o Bradesco está finalizando o processo de venda de cerca de R$ 400 milhões em financiamentos feitos a empresas.

A ideia da Caixa é fazer ao longo do ano ofertas de créditos de pessoas físicas e empresas no total de R$ 9 bilhões.

Já o Itaú estuda repassar, neste semestre, créditos de empresas que somam R$ 3,5 bilhões – a operação deve ser coordenada pelo Itaú BBA.

Ilustrações Alpino/Editoria de Arte/Folhapress

Bradesco e Itaú não quiseram comentar. A Caixa afirmou, por meio de nota, que manterá neste ano a estratégia de cessão de créditos, mas "valores e condições" ainda não foram fechados.

INCENTIVOS

Ao contrário dos Estados Unidos, onde a venda de "créditos podres" é um negócio ativo, no Brasil, trata-se de um setor que engatinha diante da baixa oferta pelos grandes bancos nacionais.

Capitalizados, eles vinham preferindo manter os créditos após as tentativas de cobrança. O aumento da inadimplência, porém, incentiva as instituições a repassarem o estoque de devedores.

Ilustrações Alpino/Editoria de Arte/Folhapress

"Para os bancos faz mais sentido focar no negócio principal, que é dar crédito, e cuidar de clientes que têm atraso curto", diz Alexandre Nobre, sócio da RCB, que desde 2008 atua neste mercado.

Com a operação, a remuneração é imediata para o banco, mas sempre menor do que o valor tomado. A Jive, por exemplo, usou R$ 112 milhões desde 2010 para cobrar R$ 4,5 bilhões em créditos cedidos por diferentes instituições (menos de 3% do valor emprestado).

O surgimento de empresas e fundos especializados como Jive, RCB e Recovery, do BTG Pactual, dá segurança aos bancos e impulsiona as operações. "É um mercado que está mais testado", diz Márcia Yagui, diretora da KPMG no Brasil.

A consultoria estima que sejam transacionados cerca de R$ 20 bilhões em créditos em 2015 –não há dados oficiais sobre a venda dessas carteiras no país.


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