Folha de S. Paulo


UE e EUA começam a negociar livre comércio; França quer deixar filmes e música fora

Barack Obama e os líderes europeus iniciaram nesta segunda-feira, 17, negociações sobre "o maior acordo bilateral de comércio da história", uma iniciativa a que o presidente dos Estados Unidos deu posição central na agenda econômica de seu segundo mandato.

Embora os líderes europeus admitam que as negociações devam ser "difíceis", eles acreditam que possam ser concluídas em dois anos.

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Obama instou os políticos a "ir além das preocupações estreitas e pensar no quadro mais amplo" de um acordo comercial envolvendo países que respondem por metade da produção econômica mundial.

David Cameron, o primeiro-ministro britânico, afirmou que um acordo teria valor de US$ 157 bilhões para os EUA, US$ 126 bilhões para a União Europeia e US$ 133 bilhões para o resto do mundo.

Obama espera que maior acesso ao mercado europeu para as companhias norte-americanas ajude a ampliar as exportações e estimule o crescimento e o emprego sem inflar o deficit comercial.

A iniciativa também poderia ajudar a atenuar as críticas de que os Estados Unidos estão negligenciando seus tradicionais aliados na Europa por estarem transferindo seu foco estratégico à Ásia.

Washington continua preocupada, porém, com a possibilidade de que as possibilidades de acordo se estreitem dramaticamente à medida que setores específicos sejam excluídos das negociações pelos europeus, o que limitaria o impacto econômico do pacto.

O lançamento das negociações, durante conferência de cúpula do Grupo dos 8 (G8) na Irlanda do Norte, terminou ficando à sombra de uma controvérsia quanto ao "reacionário" protecionismo francês.

REACIONÁRIOS

O presidente da Comissão Europeia expôs sua frustração --compartilhada por Estados Unidos, Alemanha e Reino Unido em entrevista ao jornal "International Herald Tribune".

"Há quem diga ser de esquerda quando, na verdade, é extremamente reacionário em termos culturais", disse José Manuel Barroso, no que parecia uma clara crítica ao presidente francês, François Hollande.

Ainda que não tenha mencionado a França nominalmente, Barroso disse que os críticos do comércio liberalizado de filmes e música "não compreendem os benefícios que a globalização propicia do ponto de vista cultural".

Jean-Christophe Cambadélis, dirigente do Partido Socialista francês, de Hollande, descreveu as declarações de Barroso como "incompreensíveis e intoleráveis". Um porta-voz da Comissão Europeia afirmou que os comentários do presidente eram referência aos que criticam a posição liberal da Comissão, e não ao governo de Hollande.

Nos EUA, a reação política ao início das negociações foi em geral positiva, mas legisladores importantes disseram que qualquer acordo teria de ser "abrangente", sem exclusões como a exceção que a França deseja impor quanto aos produtos culturais. "Se as negociações vão excluir as produções audiovisuais, é difícil ver como será possível impedir que fracassem", disse um assessor republicano do Senado.

ESTÍMULO

O acordo comercial entre a União Europeia e os Estados Unidos vem sendo alardeado como uma maneira barata de estimular a atividade econômica em economias que sofrem de crescimento lento e alto desemprego e ao mesmo tempo renovar o ímpeto do relacionamento transatlântico.

A influência comercial combinada dos Estados Unidos e da União Europeia também deve permitir que os dois parceiros ditem padrões à economia mundial por muitos anos, o que ajudaria a conter a ascensão de potências emergentes como a China e a Índia.

Ainda que os negociadores da União Europeia esperem incluir as produções audiovisuais nas negociações em estágio posterior, o bloqueio de Paris parece destinado a continuar. Isso teria consequências incertas, e é possível que os Estados Unidos retaliem se recusando a remover as barreiras em outros setores, por exemplo as concorrências públicas.

Barroso disse que esperava ver progresso rápido, e diplomatas britânicos acreditam que um acordo --cujo objetivo seria remover as barreiras regulatórias ao comércio internacional-- possa ser concluído em entre 12 e 18 meses.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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