Folha de S. Paulo


Mostra gratuita revê os vertiginosos últimos 30 anos do cinema brasileiro

Divulgação
Antonio fagundes e Maitê Proença em 'A Dama do Cine Shanghai' (1987)
Antonio fagundes e Maitê Proença em 'A Dama do Cine Shanghai' (1987)

Parece pouco, mas desde 1987 o que ocorreu no cinema brasileiro é de tirar o fôlego.

A agonia e o fim da Embrafilme; uma resistência patrocinada por Estados e municípios; a criação de um sistema de incentivos à produção e a consequente retomada; a criação da Ancine (Agência Nacional do Cinema) no início do século 21; os primeiros grandes sucessos da nova ordem; a consolidação do documentário; a afirmação de um ciclo de êxitos populares e do aumento da frequência média de público aos filmes brasileiros; a lenta reconquista do prestígio internacional.

É disso tudo e um pouco mais que busca dar conta a mostra "30 Anos de Cinema Brasileiro", que o instituto Itaú Cultural promove entre os dias 10 e 16 de agosto na sala 2 do Espaço Itaú de Cinema "" Augusta (simultaneamente a mostra acontecerá no Rio de Janeiro, Distrito Federal, Porto Alegre, Curitiba e Salvador).

Não se trata de uma seleção de melhores filmes do período, diz Claudiney Ferreira, gerente do Núcleo de Audiovisual e Literatura do instituto.

Nesse período em que a palavra "diversidade" foi usada com frequência, optou-se por uma seleção "panorâmica sobre a cinematografia brasileira do período", completa o curador Adhemar Oliveira.

Com efeito, não é fácil escolher 36 filmes no meio de produção tão diversa nesse período. Segundo a Ancine, foram lançados cerca de 1.400 filmes nacionais de 1995 a 2016 (quase 80% do eixo Rio-São Paulo).

A primeira escolha da mostra já é bem representativa: "A Dama do Cine Shangai" (1987) evoca o momento final da Embrafilme, fechada no início do governo Collor (1990-1992).

Já em 1993, "Alma Corsária" surgia como manifesto do desejo de permanência contra tudo e todos de um cinema sem concessões. Desejo reafirmado em "Festa", de 1995, ano em que o sucesso surpreendente de "Carlota Joaquina" soou como demonstração de que filmes e público brasileiros podiam conversar.

Esse diálogo não se deu sem altos e baixos. Uma quase unanimidade se impôs: o documentário. O que é compreensível em um país que naquele momento procurava situar-se no mundo pós-URSS.

O documentário era um meio de buscar a realidade direta, sem a intermediação da sempre contestada ficção brasileira; no mais, os novos meios digitais facilitavam a captação das imagens.

Aqui também aparece a enorme ausência da mostra. Não haverá filme de Eduardo Coutinho nos cinemas (exceto uma exibição de "Últimas Conversas" para professores). Segundo a organização, o objetivo era exibir "Santo Forte" (1999), mas não se achou cópia disponível. A obra será exibida só on-line.

Temos, em compensação, discípulos relevantes de Coutinho, como João Moreira Salles, com "Santiago" (2007), e Carlos Nader, com "A Paixão de JL" (2015).

No que diz respeito à ficção, a ideia de "diversidade" acompanha tanto a retomada como o momento de consolidação.

"Branco Sai, Preto Fica" (2014) vem de Brasília, "O Homem que Copiava" (2003), do Rio Grande do Sul, "Baile Perfumado" (1997) inaugura a fértil produção pernambucana.

Todos esses títulos passam longe dos roteiros formatados "à americana" –acreditava-se que não sabíamos escrever roteiros e recorria-se a consultores dos EUA.

Se o êxito de "Carlota Joaquina" sinalizava desapreço dos brasileiros com o Brasil de Collor, "Central do Brasil" (1998), ao contrário, encarnou a esperança de um país renovado e "limpo", resultado do sucesso do Plano Real.

A busca de sucesso com filmes que buscassem em seu conteúdo apontar problemas, pontuais ou não, da vida nacional é manifesta em "O Invasor" (2001), "Bicho de Sete Cabeças" (2000) ou "O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias" (2006).

Em outro espectro, "2 Filhos de Francisco" (2005) já prenunciava o surgimento de uma "nova classe média", e "Cidade de Deus" (2002), outro enorme sucesso, captou o interesse do público por uma abordagem menos acolhedora do banditismo, tradicional no cinema brasileiro.

A mostra se fecha, em São Paulo, com o pernambucano "O Som ao Redor" (2012), o sinal mais evidente, mais forte, de que o cinema brasileiro do século 21 podia reencontrar o prestígio internacional que já teve no passado.

Foram três décadas ricas e complexas. E mal começamos a falar delas.

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10 SUGESTÕES PARA A MOSTRA 30 ANOS
dias e horários referentes à sala 2 do Augusta

RESISTÊNCIA E INVENÇÃO

Divulgação
Cena do documentário 'Serras da Desordem' (2007), de Andrea Tonacci

'Alma Corsária' (1993), de Carlos Reichenbach (21h40, 14/8)
'Serras da Desordem' (2007), de Andrea Tonacci (21h30, 10/8)
'Branco Sai, Preto Fica' (2014), de Adirley Queirós (22h, 13/8)

SOCIEDADE EM CRISE 1 (Social)

Divulgação
Paulo Micklos em 'O Invasor' (2001), de Beto Brant

'O Invasor' (2001), de Beto Brant (20h, 13/8)
'Cidade de Deus' (2002), de Fernando Meirelles (21h30, 11/8)

SOCIEDADE EM CRISE 2 (Moral)

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Gloria Pires em 'É Proibido Fumar' (2009), de Anna Muylaert

'É Proibido Fumar' (2009), de Anna Muylaert (19h, 11/8)

EM BUSCA DO ESPECTADOR

Reprodução
#sefi61 - Serafina Ensaio 5 anos - Seleção Brasileira - Retro - Os originais - Cena de

'Carlota Joaquina' (1995), de Carla Camurati (14h, 10/8)
'Central do Brasil' (1998), de Walter Salles (19h30, 12/8)

NOVO DOCUMENTÁRIO

Divulgação
O sambista Cartola

'A Paixão de JL' (2015), de Carlos Nader (16h, 10/8)
'Cartola' (2007), de Lírio Ferreira e Hilton Lacerda (14h, 14/8)

E MAIS

SÓ NA INTERNET
no canal Itaú Cultural

'Anjos da Noite' (1987), de Wilson Barros
'Santo Forte' (1999), de Eduardo Coutinho
'A Negação do Brasil' (2000), de Joel Zito Araújo
'Ela Volta na Quinta' (2014), de André Novais Oliveira

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MOSTRA ITAÚ CULTURAL 30 ANOS DE CINEMA BRASILEIRO
QUANDO de 10 a 16 agosto
ONDE Espaços Itaú de Cinema
QUANTO grátis (distribuição de ingressos uma hora antes do início de cada sessão)


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