Folha de S. Paulo


Dior faz do azul a cor mais quente das passarelas de Paris

A interpretação da feminilidade tomou as passarelas das semanas de moda de Nova York e Milão, em coleções como as das grifes Prada, Alexander Wang, Max Mara e Versace. Mas quem deu início ao pensamento de recriar códigos do século 20 para costurar um ideal feminino foi a Christian Dior, ainda em outubro de 2016, com a estreia de Maria Grazia Chiuri no comando criativo.

Nesta coleção de inverno 2018, apresentada em Paris na sexta (3), o visual tipicamente francês dos anos 1960 e 1970, décadas seminais do movimento feminista e da revolução cultural francesa, permeou a passarela da grife montada no Museu Rodin.

O azul profundo, também chamado de "navy blue" na cartilha fashion, formou toda a base cromática usada pela grife nesta estação. Na trilha, mais tons de "blues", estes costurados por Nina Simone em "Blue Prelude" (1959) e pelo grupo The Marcels no clássico "Blue Moon" (1961).

No manual que fundou um novo padrão de pensamento sobre a beleza, o "Pequeno Dicionário da Moda", de 1954, Christian Dior (1905-1957) escreveu que a cor, "dentre todas as outras, é a única que pode competir com o preto", porque, em tese, teria as mesmas qualidades.

Em um cenário etéreo, com luzes prateadas e azuis que remetiam à estética noturna, modelos exibiam uma a uma o "new look" de Maria Grazia, uma mistura de visual esportivo -há moletons, jaquetas "bomber" e macacões com capuzes- com clássico.

O "look" chevrier, espécie de blusão com capuz combinado a uma saia de corte reto até abaixo dos joelhos e um cinto, retirado de 1947 dos arquivos da Dior, foi reinterpretado com materiais contemporâneos vindos do esporte, como um tecido que com efeito luminoso do náilon.

A estilista, mais uma vez, conjura astrologia e astronomia para criar um universo misterioso e esotérico nessa nova fase da grife.

Em vestidos transparentes e em outros costurados com veludo azul, foram bordados cristais em forma de constelações, planetas e luas com a função de gerar uma imagem de infinito nas roupas.

Desde que assumiu a grife, uma das "maisons" de luxo mais importantes do mundo, Maria Grazia Chiuri, ex-Valentino e substituta do belga Raf Simons no cargo máximo da marca, luta para encontrar sua própria versão do "new look" proposto por Christian Dior no pós-Guerra.

A revolução estética que os clientes e a imprensa especializada esperam ver na passarela parece ser costurada em doses homeopáticas.

A estilista, que já colou nas roupas da marca insetos, corações e escritos como "todas nós deveríamos ser feministas", opera em um ritmo lento, mas consciente de que, num mercado de mudanças velozes como o da moda, ganha quem firmar bases sólidas na mente do consumidor.


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