Folha de S. Paulo


Assistente de Neschling diz que viajou à Europa para audições e reuniões

Em reportagem publicada na quarta (31), a Folha revelou que um assistente de John Neschling viajou a duas cidades alemãs e a Zagreb, capital da Croácia, em 2015, poucos dias após comunicar ao maestro, por e-mail, que procuraria cargo para ambos nessas cidades.

Despesas da viagem foram pagas com verba pública, do Theatro Municipal de São Paulo, onde Neschling atua como diretor artístico e Yaksic como diretor de elenco e administrador artístico.

Em entrevista à Folha, por e-mail, Yaksic afirmou que a viagem não teve como finalidade a busca de trabalho citada no e-mail. Ele afirma que o roteiro foi previsto para reuniões e audições. A Folha havia procurado Yaksic por telefone, e-mail e por Facebook –e havia informado a assessoria do Municipal sobre o teor da reportagem–, mas não havia obtido resposta até a publicação da reportagem.

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Folha - A Folha teve acesso a um e-mail trocado entre você e o maestro John Neschling, em que você comunica a ele sua busca por trabalho na Alemanha, em Zagreb e em outras cidades da Europa. No mesmo período, o teatro comprou passagens aéreas em seu nome, para Zagreb e duas cidades alemãs, além de Bucareste. Como você explica a coincidência?

Thomas Yaksic - Não há nenhuma relação entre o e-mail e a viagem mencionados. O e-mail ao maestro Neschling foi enviado de São Paulo, quase duas semanas antes da minha chegada à Europa, e nele escrevo que iria "ligar para o Ministério da Cultura da cidade de Berlim e para a cidade de Augsburg para obter mais informações".

Como fica explícito no e-mail citado pela Folha, meus comentários sobre opções de trabalho na Europa se referem ao ano de 2017: "Se depois se elege Fernando [Haddad] e o senhor decide ficar em São Paulo, ficamos felizes. Porém é bom ter opções". Essa pesquisa informal era apenas informativa no caso de o atual prefeito não ser reeleito, acarretando uma mudança na administração do Theatro.

Ao final, não realizei essas ligações porque não eram boas opções de trabalho. Na viagem citada, visitei a trabalho as cidades de Zagreb, Paris, Berlim e Munique. A viagem em questão foi uma escala de menos de uma semana, depois de uma viagem à China, para proferir em Guangzhou uma palestra sobre criatividade e identidade programática em teatros de ópera e centros culturais como representante do Theatro Municipal.

Isso está amplamente justificado e todos os custos foram arcados pela Ópera de Guangzhou, incluindo a passagem aérea que me permitiu fazer uma escala na Europa. O IBGC apenas arcou com os custos dos trechos internos na Europa, hospedagem e alimentação. Reitero que não realizei nessa viagem e em nenhum outro momento qualquer atividade para procurar trabalho para o maestro Neschling ou outras pessoas de sua equipe, nem para terceiros.

Minhas atividades na Europa foram estritamente profissionais com relação ao TMSP e a agenda completa da referida viagem, com os comprovantes correspondentes, entreguei pessoalmente ao Corregedor Geral do Município de São Paulo logo após a publicação da matéria publicada na quarta-feira.

Comecei este trabalho como administrador artístico e diretor de casting com muito entusiasmo, pois estava participando de um projeto que aspirava fazer do Theatro Municipal não somente a melhor casa de ópera do continente, mas, sim, uma referência internacional em música clássica. Eu esperava que o TMSP fosse um grande embaixador cultural do Brasil no mundo, e esse projeto era inteiramente factível. E, efetivamente, tivemos produções espetaculares, mas, infelizmente, a crise destes últimos tempos afetou o projeto original e impediu que ele ocorresse.

Neschling, em resposta à Folha, não apontou compromissos profissionais seus em Zagreb. Você tem família em Zagreb e este teria sido o motivo da sua viagem, como ele disse? Houve compromisso profissional? É possível detalhar esse compromisso e seus benefícios para o Theatro Municipal?

É um mero erro ou um mal-entendido. O maestro pode ter se confundido devido à minha ascendência croata. Minha viagem a Zagreb foi estritamente profissional, e eu não tenho família na Croácia. Meus antepassados chegaram no Chile vindos de diversos países da Europa, entre eles a Croácia, no começo do século 20, especificamente da ilha de Brac, longe de Zagreb. Meus pais e avós nasceram no Chile e não tenho conhecimento de nenhum parente na Croácia.

Em Zagreb, tive uma reunião com um jornalista para promover o TMSP e a ópera "Fosca". Desde a minha chegada ao TMSP, consegui que o Theatro aparecesse em diversos meios da imprensa internacional, como a revista britânica "Opera", "bíblia desta indústria", como a descreveu "The Economist" no começo deste ano, a revista "Ópera Actual", da Espanha, com todas as óperas do mundo, diferentes meios de comunicação espanhóis e também várias vezes no Chile.

Meus contatos profissionais na Croácia datam da primeira viagem que realizei a Zagreb em 2012, antes de trabalhar no TMSP. Na viagem de 2015 não entrei no teatro local e nem tive reunião com nenhuma pessoa que trabalhasse nele, nem tampouco com a municipalidade de Zagreb ou com o governo croata. A principal reunião que tive na Croácia foi para evitar um processo contra o TMSP do famoso diretor de cena Giancarlo del Monaco e terminar com uma disputa desnecessária e danosa. Isso foi conseguido com muito êxito.

A Folha requereu ao Theatro Municipal e à prefeitura um relatório sobre a viagem e não obteve nenhum documento. Você produziu um relatório?

Sim, claro. Como funcionário do IBGC, devo explicar os motivos de qualquer viagem ou ação que realize tanto ao diretor do IBGC como a meu chefe direto, o maestro Neschling. Nesse caso, após a viagem, o resultado das reuniões foi informado verbalmente a meus superiores hierárquicos, nas reuniões de equipe. Nessa passagem rápida por várias cidades da Europa me reuni com diretores de teatros, artistas e colegas, para conversar sobre possíveis coproduções -isto é, juntar forças com outros teatros de ópera para montar uma mesma produção, uma das formas mais eficazes para se reduzir custos. Além disso, na qualidade de diretor de casting, assisti a várias apresentações para conhecer cantores. Como resultado direto, sugeri a contratação do barítono Lukasz Golinski, por exemplo, que participará da ópera "Fosca" no fim do ano.

Não era hábito da direção do Municipal cobrar relatórios sobre as viagens ao exterior? Os resultados eram sempre passados verbalmente?

Sim, os resultados eram sempre passados verbalmente. Por exemplo, logo após a minha viagem para a conferência da Ópera Europa em Madri, fiz uma apresentação sobre a viagem na sala do conservatório, onde estavam presentes vários departamentos do Theatro.

Quantas viagens você realizou a serviço do Theatro Municipal (pagas pelo Municipal) nos anos de 2014 e 2015? Pode dizer quais foram os destinos com suas respectivas datas de viagem?

Em 2015 viajei como representante do TMSP a Madri para a conferência Ópera Europa, da qual o teatro é membro, e na mesma viagem tive reuniões em Londres com a Royal Opera House com a finalidade de analisar possíveis coproduções e aluguéis, e para conhecer artistas. Em Madri estive entre os dias 6 e 8 de maio e, em Londres, entre os dias 9 e 11 do mesmo mês. Nesta viagem escutei a soprano Ermonela Jaho, que sugeri de imediato para uma substituição de emergência na ópera "Thaïs".

Em julho do mesmo ano estive nos dias 23 e 24 em Santiago como representante do TMSP na Conferência Anual de Ópera Latinoamérica, como consta da imprensa chilena. O TMSP pagou somente a passagem aérea, porque na noite do dia 23 me hospedei na casa de meus pais. Em 2016, entre os dias 27 e 29 de maio, viajei ao México, mais uma vez para participar da conferência Ópera Latinoamérica. Todas essas conferências constam nos websites respectivos de cada organização.

Desde quando você trabalha com Neschling? Vocês têm algum tipo de relação comercial fora do Municipal? Ele paga a você algum salário?
Absolutamente não. Sou contratado pelo IBGC desde janeiro de 2015 e, por conseqüência, desde aquele momento o maestro Neschling é meu chefe direto. Minha relação com ele é exclusivamente profissional, por meio do meu contrato com o IBGC. Não trabalho para ele nem para nenhuma outra pessoa ou instituição que não seja o IBGC, e não recebo nenhum salário de nenhuma pessoa, nem instituição à parte do salário mensal que me paga o IBGC.

Qual é o seu salário no Municipal? Qual o valor que o Municipal gasta com seu aluguel em SP?

Meu salário é de R$ 18 mil bruto ao mês e o aluguel do apartamento onde resido em São Paulo é de R$ 3.500 ao mês. Eu trabalho para o Instituto Brasileiro de Gestão Cultural. Não sou funcionário público.

Por que razão você voltou a São Paulo antes de passar por Bucareste, que também estava no roteiro de viagem?

Porque o maestro Neschling me ligou e pediu que eu voltasse com urgência à São Paulo, uma vez que o prefeito lhe havia pedido para que ele e sua equipe estivessem em São Paulo devido à crise administrativa que o Theatro estava vivendo naquele momento. Por esse motivo tive que cancelar a minha participação na conferência Ópera Europa, em Bucareste.

Você conhece os profissionais do governo croata que escolhem a direção artística do Teatro Nacional da Croácia?

Não conheço e não tive contato nenhum com o Ministério da Cultura da Croácia, nem com a Secretaria de Cultura de Zagreb, nem com nenhuma pessoa relacionada ao teatro ou algum processo de seleção de sua direção artística ou qualquer outro cargo nesse país. O único contato que tive foi em 2012, com o subsecretário de cultura do governo anterior e, nessa mesma viagem de 2012, com a prefeitura de Zagreb. Não sei quem ocupa esses cargos atualmente.

Você conhece os profissionais do governo alemão que escolhem a direção artística do Augsburg Theatre, que é mencionado no e-mail para Neschling, ou de outros teatros alemães?

Não. Não tenho e nunca tive contato algum com nenhuma pessoa que tenha trabalhado no governo alemão, seja em nível federal ou estadual, nem com nenhuma outra autoridade de qualquer tipo naquele país. Tampouco tive contato com pessoas fora do governo que poderiam ter qualquer relação com o processo de seleção de profissionais para teatros de ópera na Alemanha.

Jornais da Croácia publicaram que, em 2014, você concorreu a um cargo na diretoria do Teatro Nacional da Croácia, mencionado no e-mail a Neschling como foco da busca. Isso de fato aconteceu?

Minha primeira viagem à Zagreb aconteceu em dezembro de 2013, não em 2012, menção que foi uma recordação equivocada nas minhas respostas anteriores e que aqui retifico. Em março de 2014, enquanto trabalhava no Chile, enviei pelo correio a minha candidatura para o cargo de diretor geral do Teatro Nacional da Croácia, e no dia 28 do mesmo mês se anunciou na imprensa que eu não havia sido escolhido para o cargo.

Foi uma candidatura pública, perfeitamente natural para alguém com vocação em gestão cultural. Para me candidatar a esse cargo, estudei cuidadosamente os estatutos e as circunstâncias do teatro de Zagreb, e por isso sinalizei no e-mail citado pela Folha que, a meu ver, era um teatro com muito potencial.

Minha segunda viagem a Croácia foi em julho de 2014 para assistir ao Festival Internacional de Dubrovnik, sem passar por Zagreb. Na ocasião fui entrevistado, uma vez que na época era Coordenador Artístico do Teatro Municipal de Santiago, e exprimi minha opinião sobre assuntos culturais e me referi também ao trabalho que realizávamos no Teatro Municipal de Santiago. Minha terceira viagem à Croácia foi em novembro de 2015, à Zagreb. Essa viagem teve o propósito já expresso. Como afirmei anteriormente, não tive entrevistas com nenhuma autoridade nessa ocasião.


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