Folha de S. Paulo


Quadro milionário de Modigliani é arrematado por ex-taxista chinês

O ex-taxista e atual bilionário colecionador de arte Liu Yiqian confirmou na terça-feira (10) que é o comprador da pintura de Amedeo Modigliani de uma mulher nua que foi vendida por US$ 170,4 milhões pela casa Christie's de Nova York na noite de segunda (9).

Falando ao telefone de Xangai, o colecionador chinês disse que pretende levar a obra para a cidade, onde ele e sua mulher são donos de dois museus particulares.

"Pretendemos expor a obra no quinto aniversário do museu", disse Liu. "Será uma oportunidade para os chineses amantes da arte verem obras de arte de alta qualidade sem precisar sair do país. Essa, aliás, foi uma das principais razões por que fundamos os museus."

Fazendo lances pelo telefone, Liu, 52 anos, foi uma das seis pessoas que disputaram no leilão a tela de Modigliani, "Nu Couché", de 1917-18. O preço final de US$ 170,4 milhões, com taxas incluídas, superou de longe o recorde anterior de US$ 70,7 milhões marcado na venda de uma obra de Modigliani em um leilão.

Com o lance vencedor de Liu, "Nu Couché" torna-se o décimo título a entrar para o clube de elite das obras de arte vendidas em leilões por valores de nove algarismos.

Timothy A. Clary/AFP
Quadro 'Nu Couché', arrematado pelo bilionário chinês Liu Yiqian
Quadro 'Nu Couché', arrematado pelo bilionário chinês Liu Yiqian

"As obras de Modigliani já têm valor reconhecido no mercado", disse Liu. "Esta tela é relativamente simpática, comparada às outras pinturas de nus do artista. E suas pinturas de nus foram colecionadas por alguns dos maiores museus do mundo."

Em sua adolescência em Xangai, durante os anos turbulentos da Revolução Cultural, Liu vendeu bolsas na rua e, mais tarde, trabalhou como chofer de táxi. Depois de abandonar o ensino médio, ele avançou no embalo da abertura e reforma econômica da China, ganhando uma fortuna como corretor de ações nos setores imobiliário e farmacêutico nas décadas de 1980 e 1990. Segundo a edição 2015 do Índice Bloomberg de Bilionários, a fortuna de Liu hoje vale no mínimo US$ 1,5 bilhão.

"Colecionar arte é, para mim, sobretudo um processo de aprender sobre a arte", falou o bilionário em entrevista ao "New York Times" em 2013. "Em primeiro lugar é preciso gostar de arte. Em seguida, é possível entendê-la."

Liu e sua mulher, Wang Wei, estão entre os colecionadores de arte mais visíveis da China —para alguns, mais espalhafatosos. Ao longo dos anos eles montaram uma enorme coleção de arte chinesa, tanto tradicional quanto contemporânea, boa parte da qual está exposta em seus dois museus em Xangai: o Long Museum Pudong, aberto em 2012, e o Long Museum West Bund, inaugurado no ano passado. Wang, 52 anos, é a diretora dos dois museus.

"Há uns dois anos tive a ideia de que o Long Museum deveria colecionar objetos internacionais", comentou Wang, dizendo que seu marido tem dado muito apoio ao seu trabalho.

A coleção do casal inclui uma pintura em seda do século 15, chamada "Thangka", comprada por Liu por US$ 45 milhões num leilão da Christie's em Hong Kong no ano passado. A aquisição fez manchetes por quebrar o recorde de valor de uma obra de arte chinesa vendida em leilão internacional.

Com a compra da "Thangka", Liu superou o recorde que ele próprio tinha marcado meses antes ao pagar US$ 36,3 milhões num leilão da Sotheby's por uma pequena xícara de porcelana da dinastia Ming, conhecida como "xícara das galinhas". Pouco depois disso ele causou um furor quando uma foto se alastrou online mostrando-o tomando chá na xícara.

Liu teria pago pelas duas compras com um cartão de crédito American Express, o que lhe teria valido muitos milhões de pontos de prêmio.

As táticas de autopromoção usadas pelo casal levaram algumas pessoas dos círculos da arte contemporânea na China a traçar comparações com o "magnata dos táxis" Robert Scull e sua mulher Ethel, vorazes colecionadores do que seria conhecido como "pop art" na década de 1960, mas vistos por alguns no mundo da arte como novos-ricos de mau gosto.

Falando de Liu e Wang, Philip Tinari, diretor do Centro Ullens de Arte Contemporânea, em Pequim, comentou: "São colecionadores que têm tanto dinheiro que adquirem bom gosto ou que não precisam ter bom gosto porque compram tudo o que aparece. Há muito pouca discriminação —eles simplesmente compram as coisas mais caras. Não são 'connoisseurs'."

Liu disse que "Nu Couché" será a obra de arte mais cara de sua coleção. Mas, perguntado se pretende pagar com cartão de crédito outra vez, ele negou.

"O método de pagamento usado vai seguir as diretrizes da Christie's", falou.

Tradução de CLARA ALLAIN


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