Folha de S. Paulo


Inspirado por rival roqueiro, Samba in Rio traz Jorge Ben, Monarco e Molejo

Para Beth Carvalho, 69, é "uma religião" e "uma cura". Monarco, 82, acha que "se tem alguém que não gosta, bom sujeito não é". Anderson Leonardo, 42, vocalista do Molejo, cunhou o "pagode universitário" para dar nova roupagem ao que todos eles chamam de "o mais brasileiro dos ritmos".

Já Babi Cruz, 44, viu ali uma oportunidade para sambar na cara do rock. E idealizou um festival que reúne esses nomes e outros como Jorge Ben Jor, Martinho da Vila, Alcione, Raça Negra e Alexandre Pires, sábado (18) e domingo (19), no sambódromo carioca.

O Samba in Rio, diz, é uma resposta para "o tratamento VIP, o tapete vermelho e os camarins maravilhosos" do Rock in Rio. "Sempre me indaguei por que nós, os donos da casa, não tínhamos nosso próprio evento para um som que representa nosso país."

Robson Ventura - 12.jul.2014/Folhapress
Show do Raça Negra em 2014; banda é uma das atrações do Samba in Rio neste fim de semana
Show do Raça Negra em 2014; banda é uma das atrações do Samba in Rio neste fim de semana

Evento que criou na raça, porque patrocínio que é bom, quase nada, conta a ex-porta bandeira Babi, casada com o sambista Arlindo Cruz. "Ainda não pagamos o cachê de 80% dos artistas." A empreitada, que beira os R$ 7 milhões, pode captar R$ 3,9 milhões com incentivos fiscais da Lei Rouanet, mas nenhum dinheiro foi levantado ainda, diz.

Para Monarco, nada disso importa. "Se não tocar no rádio, a gente toca lá em cima, se não tiver grana a gente canta também", afirma o mestre da Velha Guarda da Portela.

"Ainda existe, sim, um preconceito contra o samba, resquiciozinho de quando o negro foi libertado no Brasil."

Monarco, contudo, não desanima e canta Nelson Sargento pelo telefone: "Samba, agoniza mas não morre/ Alguém sempre te socorre/ Antes do suspiro derradeiro".
"O samba já sofreu muito, mas hoje está sendo reconhecido como patrimônio. Não precisa bater boca com ninguém do rock, da lambada, do funk. Fica quietinho, e quando chega contamina", diz.

O nome do festival não deve criar dissabores, defende o sambista octogenário. "Parece que a gente quer menosprezar, debochar de alguém, mas nós gostamos de roqueiro."

Não só de roqueiro: o festival terá "intrusos" como Marcelo D2 e Ana Carolina, que já flertaram com o ritmo antes.

O Anderson do Molejo, para quem "o pagode é o filhote mais famoso do samba", gosta desse mix de culturas musicais. Chama isso de "globalização" -e o gênero pode e deve se adequar a ela, acredita.

Vide o título "americanizado" dos shows "in Rio". Também usa músicas "poliglotas" de sua banda de exemplo. Como "Merci Beaucoup", que diz: "Eu nem digo 'I love you'/ Ela já quer 'merci beaucoup'".

BATUQUE SALGADO

As canções podem sair doces, mas os preços do Samba in Rio foram considerados salgados por uma de suas atrações. O público paga e R$ 80 a R$ 220, com possibilidade de meia-entrada. A ideia inicial era chegar a R$ 800 (valor da frisa para quatro pessoas, alternativa que acabou cancelada), o que espantou Monarco.
"Acho muito caro, né? Poxa, com uma crise dessas, o pessoal tá duro, eu não dou [o preço do ingresso]. Só a pessoa deitada em dinheiro", diz.

Babi reconhece que alguns valores são "impraticáveis", mas os justifica: "Hoje todo mundo paga meia-entrada, o preço cheio é 'pro forma'. Se você tem mais de 60 anos paga meia, se for estudante, se tiver cabelo azul, vermelho..."

Fafá de Belém, que canta com Martinho da Vila no sábado, não vê exagero. "O evento é feito a duras penas, espremendo orçamento. Enquanto isso, na 'sala da injustiça', cachês e estruturas milionárias rolam para alguns eventos que são o verdadeiro "samba do crioulo doido."

SAMBA IN RIO
QUANDO sáb. (18) e dom. (19), a partir das 14h
ONDE Praça da Apoteose, av. Marques de Sapucaí s/n
QUANTO de R$ 80 a R$ 220,00 (pista VIP para os dois dias)


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