Folha de S. Paulo


Em sabatina Folha, Colm Tóibín relata como morte da mãe influenciou livro

Na Livraria Cultura do Shopping Bourbon, o escritor Colm Tóibín falou sobre as inspirações para o livro "Nora Webster" (ed. Companhia das Letras, R$54,90, 400 págs.). A ideia inicial para a trama, contou, veio do que aconteceu em sua casa depois que a mãe morreu.

"Um dos desafios que tive [no livro] foi tirá-lo do dia a dia, pensar em como dar outro nível a ele", disse, brincando que talvez falar sobre essa inspiração fosse complicado demais para uma segunda-feira.

Em conversa com a repórter especial da Folha Sylvia Colombo, o autor entremeou divagações sobre o romance com a leitura de trechos da obra.

Zanone Fraissat/Folhapress
O escritor irlandês Colm Tóibín, em mesa na Flip
O escritor irlandês Colm Tóibín, em mesa na Flip

Sobre a experiência na Irlanda nos anos 1960, Tóibín disse que não se lembra de minissaias, drogas e que "se havia sexo, era feito à noite". Essa diferença entre a vivência nos anos 1960 na Irlanda e no resto do mundo, afirmou, está presente no livro, no qual parece que o tempo parece passar mais lentamente para Nora do que para o resto do mundo. "Algumas oportunidades culturais não chegavam."

Embora tenha baseado a história em sua experiência familiar, optou por não contá-la de seu ponto de vista, e sim da mãe. "É difícil sustentar um romance pelos olhos de um garoto de 12 anos. Ele não tem tantas escolhas. Talvez dê para escrever três histórias curtas, mas é difícil fazer um romance pela perspectiva de uma criança", avaliou.

O autor não é, porém, iniciante na construção de personagens femininos fortes –caso de "Brooklyn", por exemplo. "Meus próximos livros serão sobre homens", brincou.

Tóibín cresceu rodeado por mulheres, suas irmãs e tias. "Havia algo ali que merecia minha atenção. Às vezes elas me tiravam da sala, porque eu lembrava com detalhes de todas as conversas um ano depois", disse.

BUENOS AIRES

Ele falou também sobre sua experiência como jornalista e a influência disso em sua obra. "Estive na Argentina em 1985 para o julgamento dos generais", afirmou. "É uma questão hoje o quanto isso influencia na ficção. Como alguém que não viveu o holocausto pode escrever sobre isso?"

Enquanto circulava por Buenos Aires, ouvia pessoas falando sobre pessoas desaparecidas. "Fiquei interessado no que aconteceu logo depois da parte sangrenta. O país descobrindo o que aconteceu. Como foram esses anos? Não senti que tinha o direito de escrever um livro sobre a tortura", disse. "É uma questão moral para um romancista, saber se você pode entrar nessas histórias em que tantas pessoas sofreram."

"Mas pensei que poderia dramatizar o período em que o país tentava se recuperar. E para isso usei o tempo que passei em Buenos Aires", disse. "Aprendi muito sobre a sociedade argentina escrevendo sobre Maradona, entrevistando fãs de futebol, jogadores, falando com jornalistas esportivos."

O escritor afirmou ainda que pretende escrever uma história sobre o que aconteceu após a morte do general Francisco Franco, na Espanha. "Ainda não escrevi um romance sobre isso, mas espero conseguir fazê-lo em algum momento."

Voltando da Flip (Festa Literária Internacional de Paraty), Tóibín falou sobre a divulgação de seu trabalho, prática que não era tão comum para escritores no passado. "Não dá para reclamar de estar na praça em Paraty e ter que decidir se você vai tomar outra caipirinha ou não", disse.

Contou brincando que não entende muito os eventos literários na Alemanha. "Primeiro o escritor lê um trecho do romance por uma hora. Depois, alguém lê o mesmo trecho em alemão por outra hora. Ninguém sabe se de fato as pessoas estão ouvindo", falou. Acrescentou que os escritores devem tentar escolher um trecho com bastante sexo para ler. "Por algum motivo, os velhos alemães adoram!"


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