Folha de S. Paulo


Crítica: Contratenor faz interpretação para ser guardada na memória

Philippe Jaroussky entrou na terça (11) no palco da Sala São Paulo com os 16 músicos do Ensemble Artaserse. Sentou-se atrás do grupo e aguardou os três movimentos do "Concerto para Cordas em Dó Menor", de Vivaldi (1678-1741).

Quando o público já estava hipnotizado pela unidade de articulações e dinâmicas das cordas –e sem deixar espaço para aplausos–, o contratenor francês de 36 anos atacou o doloroso "Stabat Mater" do mesmo compositor.

Todo o programa foi dedicado a Vivaldi: duas obras sacras (cantadas em latim) separadas por concertos instrumentais (na primeira parte), e, após o intervalo, trechos de óperas (cantadas em italiano) divididos pelo "Concerto para Dois Violinos op. 3 nº 8".

Cribesvo Van Tao/Divulgação
O contratenor francês Philippe Jaroussky
O contratenor francês Philippe Jaroussky

Contratenores se especializam em um registro vocal superagudo, que transcende o tenor na direção das vozes femininas do contralto e mezzo-soprano. Ao longo do século 20, eles se apropriaram do repertório barroco que fora cantado originalmente pelos "castrati".

A riqueza da temporada clássica paulistana neste ano permitiu que dois dos mais importantes contratenores da atualidade se apresentassem aqui: o alemão Andreas Scholl (em maio, pela série Tucca), e agora Jaroussky, fechando a série Cultura Artística).

Faz toda a diferença o cantor ser parte integrante do grupo, e não apenas um solista convidado. Há uma escuta profunda entre eles, uma timbragem perfeita e um diálogo generoso –como quando as cordas esperam a voz ressoar nas progressões de quartas.

Jaroussky é impecável tecnicamente. Faz todas as coloraturas –aqueles desenhos de voz ágeis e ornamentados– sem esforço, e toda a sua atenção vai para o sentido afetivo e cognitivo do texto. Cantou tudo de memória.

As óperas de Vivaldi são muito menos conhecidas do que os seus concertos instrumentais –quem já ouviu falar de "Il Giustino", executada pela primeira vez em 1724? A ária "Vedrò con Mio Diletto" (Verei com meu deleite) é parte dela.

Sobre as linhas descendentes das cordas, Jaroussky apoia delicadamente as notas finais das frases, enquanto o texto diz: "Verei com deleite /A alma da minha alma /O coração do meu coração". É para guardar na memória.

PHILIPPE JAROUSSKY e ENSEMBLE ARTASERSE
QUANDO qui. (13), às 21h
ONDE Sala São Paulo, praça Júlio Prestes, 16, tel. (11) 3223-3966
QUANTO esgotado
CLASSIFICAÇÃO livre
AVALIAÇÃO ótimo


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