Folha de S. Paulo


Biógrafo de Roberto Carlos lança livro sobre disputa judicial com o Rei

O biógrafo Paulo Cesar de Araújo lançou nesta terça (20), sem alarde, o livro "O Réu e o Rei", sobre bastidores da disputa que levou à proibição da biografia "Roberto Carlos em Detalhes", de 2006. A obra foi recolhida em 2007 após acordo entre cantor, editora (Planeta) e autor.

"O Réu e o Rei", editado pela Companhia das Letras, chegou às livrarias sem a habitual divulgação que precede o lançamento de livros desse porte e sem o conhecimento de Roberto Carlos e seus advogados, uma estratégia para evitar que o título não chegasse às estantes.

No livro, Araújo relata 16 anos de pesquisa, centenas de entrevistas que fez para "Roberto Carlos em Detalhes" e a relação dele próprio com as músicas de seu ídolo.

André Durão/UOL/Avener Prado/Folhapress
Roberto Carlos fala sobre show em navio; à esq. Paulo César de Araújo é entrevistado no 'Roda Viva
Roberto Carlos fala sobre show em navio; à esq. Paulo César de Araújo é entrevistado no 'Roda Viva'

Após o lançamento de "Roberto Carlos em Detalhes", o cantor alegou que a biografia invadira sua intimidade, e acionou o autor e a editora nas esferas cível e criminal.

"Senti a necessidade de mostrar a gravidade da situação", diz Araújo. "Sou um fã de Roberto que viveu uma situação dramática. Mas o Roberto tem uma multidão de fãs, eu sou apenas mais um. E minha trajetória, minha relação com suas músicas, é comum a muitos fãs dele."

Avisado do lançamento pela Folha, Marco Antônio Campos, advogado de Roberto, afirmou que iria comprar o livro para examinar se há trecho considerado ofensivo.

Livro
O Réu e o Rei
Paulo Cesar de Araújo
O Réu e o Rei
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Ao saber que o livro cita os encontros do artista com a cantora Maysa (1936-1977) e a atriz Sonia Braga, considerados "invasão de privacidade" no processo de 2007, Campos disse que o autor está invadindo "área delicada".

Araújo diz não temer novos processos. "Se eu fosse me preocupar com os advogados de Roberto, eu não iria escrever nenhum livro nunca mais. Tenho compromisso com a história da cultura brasileira", afirmou.

Em "O Réu e o Rei", Araújo conta que, segundo Roberto, o biógrafo é um usurpador da história alheia, "como se a história de uma figura pública não pertencesse também à coletividade nem fosse de interesse geral".

Hoje é possível barrar biografias feitas sem a autorização de biografados ou herdeiros por meio de dois artigos do Código Civil. A Câmara aprovou neste mês um projeto que permite a publicação de biografias sem autorização. O texto seguiu para o Senado e, caso seja aprovado, vai à sanção presidencial.

A discussão sobre a necessidade de autorização prévia para esse tipo de obra também corre no Supremo Tribunal Federal. Na semana passada, Roberto Carlos entrou no tribunal em defesa dos artigos, alegando que garantem o direito à privacidade.

TRECHOS

O juiz Tércio Pires nos recebeu de pé com os promotores Fausto Junqueira de Paula e Alfonso Presti. A escrevente Silvana Mori também já estava lá.
Antes de sentar, todos se cumprimentaram apertando as mãos — o que não aconteceu entre mim e Roberto Carlos. Não por indelicadeza, mas pelo lugar que logo ocupamos na sala. O cantor se posicionou do lado direito do juiz, enquanto eu fui para o esquerdo, ficando do outro lado da mesa de reunião. Para haver o aperto de mão, precisaríamos dar uns três passos em direção ao outro, mas nem eu nem ele tomamos a iniciativa. Exatamente nesse instante me lembrei de um verso de "Pensamentos", uma de suas canções pacifistas, que diz: "Quem me dera que as pessoas que se encontram/ Se abraçassem como velhos conhecidos/ Descobrissem que se amam/ E se unissem na verdade dos amigos".

"Você escreveu que eu participei de orgias com garotas menores no apartamento de Carlos Imperial! Você me chamou até de covarde neste livro!"
Nesse momento tive certeza de que o cantor não havia lido a biografia. Qualquer leitor de "Roberto Carlos em Detalhes" sabe que ali não existem essas acusações. Respondi: "Roberto, você talvez seja a única pessoa que viu isso no meu texto. Nem mesmo seu advogados que aqui estão acreditam que escrevi tais coisas sobre você".

Roberto Carlos nada falou sobre o Brasil, sobre o governo Lula, sobre o papel dos Estados Unidos no mundo. É assim desde que ele despontou para o sucesso, há mais de 40 anos. Como não gosta de falar de política e também não se interessa por filosofia, economia, sociologia ou literatura, os temas de suas entrevistas costumam ficar restritos basicamente à sua vida pessoal e a alguns aspectos da carreira. Foi o que aconteceu mais uma vez nesse depoimento ao "Fantástico", em que, para justificar a censura a um livro, argumentou que "privacidade é uma coisa fundamental em ser protegida".

Extraídos de "O Réu e O Rei"


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