Folha de S. Paulo


Crítica: 'Tá no Ar' acerta tom ao zombar da própria TV

Há duas semanas, a Globo lançou um novo programa de humor, o "Tá no Ar", criação de Marcelo Adnet e Marcius Melhem. Ao contrário das últimas produções da emissora, a reação foi a melhor possível.

Os telespectadores elogiaram o programa em profusão na internet, humoristas o saudaram como "revolucionário" e, o mais raro, praticamente toda a crítica de TV se rendeu com loas e elogios à criatividade dos quadros e talento coletivo dos atores.

Parece exagero, mas não é. Nos tempos atuais de formatos copiados, de humor imbecilizante do tipo "Zorra Total" e "Divertics" (para ficar só na mesma Globo), "Tá no Ar" é uma verdadeira lufada de alegria. Surpreendente em se tratando de uma Globo tão popularizada.

Alex Carvalho/Divulgação/TV Globo
Marcelo Adnet (de Dom Pedro 1º) e Marcius Melhem em 'Tá no Ar'
Marcelo Adnet (de Dom Pedro 1º) e Marcius Melhem em 'Tá no Ar'

Isso porque o humorístico usa vários elementos já perdidos na TV e no humor, como a metalinguagem, a autorreferência e, principalmente, o gracejo com a concorrência.

Há quantos anos não se via alguém imitando Silvio Santos na Globo? Ou se ouvia uma ironia aberta a um programa da concorrência, como o "Brasil Urgente"? E o segundo episódio foi tão inspirado quanto o primeiro.

Mas nem é só isso. "Tá no Ar" ora tem cara de história em quadrinhos, ora brinca com quadros totalmente nonsense como "Pesca Fatal" (tão idiota e eletrizante que o final foi apoteótico e de morrer de rir), ou "Sexy Indecisa" —uma adaptação besta de "Sex & The City"

Há outras boas sacadas originais, como o constante zapping de alguém que estaria assistindo ao próprio programa, ou o guerrilheiro pateta que fica achincalhando a Globo e a mídia. Logo no primeiro episódio, uma regra de ouro já foi quebrada pelo programa, ao sacanear com o candomblé, com o quadro da galinha pretinha pintadinha, e o rap do cristão —uma das melhores performances do talentoso Adnet na estreia.

Por último, há a questão do Ibope. Uma das ideias centrais do programa era que ele ironizasse o vale-tudo das TVs pelo Ibope. Bem, nesse quesito o risinho ainda é meio amarelo porque "Tá no Ar" não mexeu nem uma vírgula na audiência que a Globo obtinha antes dele existir. Pior: enquanto ele marcou 10,7 pontos em suas duas primeiras edições, o seriado "Doce de Mãe" chegava a marcar 13,5 pontos (cada ponto equivale a 65 mil domicílios sintonizados na Grande SP).

Teve quem comparou o programa ao extinto "TV Pirata". Outros viram semelhanças com o velho e bom "Casseta". A verdade é que "Tá no Ar" não se parece com nada disso. E aí está sua maior qualidade: é um produto novo e puramente nacional. Nada de formatinho comprado da Fremantle. Nada de reality musical ou "BBB"esteiras. Vida inteligente no próprio planeta Globo.

A pergunta que fica é: até quando? Até quando a Globo vai liberar cordinha para esses humoristas "violarem" o código do politicamente correto que foi imposto pela própria casa nas últimas décadas? Até o dia em que uma piada com um eventual patrocinador virar crise diplomática? Então, por enquanto, vale a pena aproveitar e rir.

NA TV
Tá no Ar
Humorístico
QUANDO quintas, às 23h55, na Globo
AVALIAÇÃO ótimo


Endereço da página: