Folha de S. Paulo


Pintor de bananas durante a ditadura, Antonio Amaral é relembrado em exposições em SP

No começo, elas eram verdes, saudáveis, exuberantes. Depois, amadureceram até apodrecer. Foram parar no prato, destroçadas por garfos e enforcadas por cordas até que não sobrasse mais nada.

Do verde ao amarelo e ocre, as bananas de Antonio Henrique Amaral, frutas que dominaram cerca de 200 pinturas do artista nos anos 1960 e 1970, entraram para a história da arte brasileira como metáfora tropical dos descaminhos da ditadura que começou com o golpe de 1964.

Fase nova-iorquina decreta o fim das bananas de Amaral

"Queria esculhambar com o governo militar, que estava reduzindo o Brasil a mais uma república das bananas, como eram as republiquetas centro-americanas", diz Amaral, 78. "Meu desafio era pintar e, ao mesmo tempo, refletir sobre a tortura e as prisões numa coisa explosiva, sarcástica, de deboche."

Suas bananas estrearam com um estrondo em 1968, no auge da arte pop e da nova figuração, que dissolviam a austeridade do concretismo e viraram uma espécie de síntese colorida da tropicália de Caetano Veloso e Gilberto Gil.

Agora, quase três décadas depois do fim da ditadura, Amaral e suas bananas são relembradas em duas mostras em São Paulo -uma retrospectiva com 160 obras na Pinacoteca do Estado e uma exposição de cem desenhos e gravuras que começa neste sábado na Caixa Cultural.

Divulgação
'Brasiliana 9', pintura de Antonio Henrique Amaral, de 1969
'Brasiliana 9', pintura de Antonio Henrique Amaral, de 1969

Ele lembra que na ditadura os censores do regime notaram as pencas de ironia plasmadas nas telas. "Mas eles cairiam no ridículo fechando uma exposição de bananas", afirma. "Esse foi meu jeito de fazer uma sátira sem ser massacrado por eles."

Mais do que uma sátira, Maria Alice Milliet, curadora da mostra na Pinacoteca, vê uma série de elementos nas polêmicas telas. "A banana é o fálico, a latinidade, o luxuriante, o tropicalismo", afirma. "Elas serviam para tudo."

Também serviram para alçar o artista ao panteão de sua geração no circuito das artes visuais no país. Com as bananas, Amaral venceu o Salão Nacional de Arte Moderna e disse adeus ao Brasil, indo morar em Nova York ao longo da década seguinte.

Lá, "onde tudo podia", ele decidiu "matar as bananas".

ANTONIO HENRIQUE AMARAL
QUANDO na Pinacoteca, de ter. a dom., das 10h às 17h30, qui., até 22h; até 23/2; na Caixa Cultural, abre sáb., 14, às 11h; de ter. a dom., das 9h às 19h; até 16/2
ONDE Pinacoteca (pça. da Luz, 2, tel. 0/xx/11/3324-1000); Caixa Cultural (pça. da Sé, 111, tel. 0/xx/11/3321-4400)
QUANTO R$ 6 (Pinacoteca); grátis (Caixa Cultural)


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