Janio de Freitas
Inflação de 2014 mostra que Mantega tinha razão ao sustentar que não existia 'descontrole inflacionário'
Bom para muitos, não para Dilma Rousseff. Ótimo para um, péssimo para vários. Assim é este número sem charme: 6,41.
No primeiro dia útil da semana, Guido Mantega deixou o governo com a discrição dos vencidos, desenhado por muitos dos economistas e por quase todo o jornalismo de economia como incompetente para as atuais circunstâncias, em grande parte atribuídas ao que seriam seus erros.
No último dia útil da semana, o divulgado índice da inflação em 2014, de 6,41%, demonstrou: quem estava certo era Guido Mantega. Até muito perto do fim do ano, sua insistência em que a inflação ficaria abaixo do "teto" de 6,5%, fixado para o ano foi contestada ou posta em dúvida crítica. Com isso, o alegado "descontrole inflacionário" passou de tema econômico a tema político, gerando um clima de desalento que justificou o retorno dos juros à escala antissocial, contrária ao crescimento econômico e prejudicial à distribuição de renda. Tudo isso para quê? Ou, melhor, para quem?
Com a inflação dentro da faixa aceita no início daquele ano como conveniente, Dilma Rousseff vê neutralizar-se uma carga opositora que a enfraqueceria e favoreceria Joaquim Levy, nos casos, bastante prováveis, de divergência entre a presidente e o ministro.
Mas a inflação "dentro da meta" é um comprovante a mais, agora de teor econômico, da precipitação com que Dilma Rousseff adotou as teses e os métodos do (neo)liberalismo conservador. Uma afirmação absurda de que, entre os adeptos do crescimento econômico como prioridade e desenvolvimento social como obrigação humana, não são encontráveis gestores e métodos capazes de bem conduzir a economia.
Guido Mantega foi espremido. Não teve o reconhecimento da parte que lhe coube no êxito econômico do segundo mandato de Lula, nem lhe foi concedida a ressalva, no governo Dilma, de que conteve fora as ondas piores da crise internacional. Para negá-lo, os comentaristas neoliberais comparam o Brasil com o crescimento de alguns vizinhos, fazendo por esquecer que a agressividade da crise é menor com economias menos desenvolvidas, ou menos complexas. França, Itália, Espanha, Rússia, China, a fortaleza alemã, além de outros, não escaparam aos efeitos nocivos.
DIFERENÇAS
Há um lado positivo no aparecimento de Antonio Anastasia entre os citados pelo ex-entregador de dinheiro ilegal a mando de Alberto Youssef. Não pela pessoa de Anastasia. Condutor da parte administrativa dos governos mineiros de Aécio Neves, enquanto Andrea Neves controlava a parte política e publicitária, Anastasia se tornou sucessor natural do chefe. Seria o ministro da Casa Civil se Aécio derrotasse Dilma, e elegeu-se senador. Sempre pelo PSDB.
A inclusão de Anastasia na Lava Jato fez a imprensa e a TV afinal pensarem um pouco na inconveniência de encampar e amplificar denúncias feitas por gente desqualificada e sem prova, sem sequer indício. E, na Lava Jato, sem que haja notícia das indispensáveis investigações para comprovar ou desmentir o delator premiado. Os vazamentos têm bastado para a imprensa e a TV.
Mas Anastasia e a concomitante acusação ao deputado peemedebista Eduardo Cunha já tiveram tratamento diferente. É o efeito tucano.
OS ESPECIALISTAS
Evidências do quanto estavam bem treinados os terroristas na França, como está propalado.
Foram em três prédios à procura da Redação do "Charlie Hebdo". Não sabiam em que andar ficava. Perguntaram na portaria e, com aquela indumentária, foram mandados para o terceiro andar. Subiram e voltaram. No segundo, correto, não tinham como entrar na Redação: ignoravam o sistema eletrônico de abertura. Forçaram uma pessoa da portaria, que tinha o cartão magnético.
Estavam tão cientes de que os pormenores fazem o êxito ou o insucesso de operações assim que, como se fossem eles os humoristas, portavam suas carteiras de identidade e deixaram uma no carro de fuga. Sem ter, aliás, um plano de fuga e desaparecimento imediato: ficaram rodando mais de 24 horas em carros roubados.
Obtusidade igual, só a da polícia e das autoridades francesas: decidiram matar os três, e ficaram sem ter quem dê informações diretas sobre o que pode haver por trás do ataque e dos caros fuzis AK-47.
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