Folha de S. Paulo


21/12/2005 - 11h04

Copa no Brasil ainda é só desejo, diz presidente da Fifa

FÁBIO VICTOR
da Folha de S.Paulo, em Zurique

O presidente da Fifa, Joseph Blatter, afirmou ontem que a realização da Copa do Mundo de 2014 no Brasil, dada como certa pela CBF e por boa parte da comunidade futebolística do país, está longe de ser uma garantia.

Conforme o rodízio continental definido pela entidade que rege o futebol mundial, a edição de 2014 será mesmo na América do Sul. Também é fato que a Conmebol (Confederação Sul-Americana) já se posicionou favorável a uma candidatura única do Brasil.

Mas, questionado pela Folha se a certeza do Brasil tinha respaldo na Fifa, o dirigente falou em outros candidatos no continente e enumerou obstáculos, deixando claro que por ora o projeto brasileiro não pode ser considerado muito mais do que um desejo.

"A única decisão tomada pelo Comitê Executivo da Fifa é que a Copa de 2014 será disputada na América do Sul, mas ainda não abrimos as inscrições de candidaturas, e todas as confederações nacionais podem apresentar uma. Se haverá só uma... não sei, talvez duas ou três. Sei que o Chile está considerando uma candidatura, talvez a Bolívia e outros países em conjunto", disse.

O Chile, que já foi sede do Mundial de 1962, é hoje o país com os melhores índices sócio-econômicos do continente.

"Não posso prever o futuro, mas o Brasil não deveria estar tão certo de que vai organizar a Copa, porque há um caderno de encargos, e o país terá de atender a todas essas exigências", prosseguiu o dirigente suíço.

Diante do sorriso de uma repórter à resposta, Blatter ainda provocou: "Você está rindo, mas organizar uma Copa do Mundo é uma coisa muito séria. Não é somente Copacabana".

O dirigente deu as declarações após uma entrevista coletiva em Zurique na qual fez um balanço do ano e traçou planos para 2006. Atendeu por alguns minutos três jornalistas brasileiros para questões relativas ao país.

O "choque de realidade" de Blatter é um alerta para o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, que há anos acalenta o sonho de trazer de novo o Mundial para o Brasil. No cargo desde 1989, o cartola dá sinais de que pretende seguir no comando da confederação até 2014 só por causa do projeto, ao qual dedica hoje boa parte de suas articulações políticas.

Tem se reunido com políticos em busca de apoio, já foi a Brasília fazer lobby e fez promessas a dirigentes de federações de que seus Estados seriam agraciados com uma das sedes do torneio.

Tem o governo federal como aliado: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já revelou em diversas ocasiões seu entusiasmo com a idéia, abraçada com fervor também pelo ministro do Esporte, Agnelo Queiroz.

As candidaturas à sede da Copa de 2014 serão apresentadas no ano que vem, e a escolha acontece em 2008. O Mundial de 2010 terá lugar na África do Sul.

Escândalo da arbitragem

Num outro indício de que sua relação com Teixeira, cuja aspiração é um dia se sentar na cadeira hoje ocupada pelo suíço, pode estar menos afinada do que sugerem as aparências, Blatter insinuou que foi infeliz a decisão de anular os jogos do Brasileiro apitados pelo juiz Edilson Pereira de Carvalho, envolvido em escândalo de manipulação de resultados.

As 11 partidas foram repetidas, o que permitiu ao Corinthians levar o título. Tratou-se de uma decisão do STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva), em tese desvinculado da CBF, mas Blatter reverteu a responsabilidade para a confederação.

"Isso é um problema da CBF, que resolveu pelo cancelamento. Dei a eles um conselho de como agir, mas eles fizeram o que achavam que tinham de fazer. Não posso dizer mais do que isso. Eles fizeram, então devem encarar os problemas. Na Alemanha [onde ocorreu escândalo semelhante], eles não cancelaram os jogos."

Após a conquista corintiana, um torcedor do Inter, que teria levado a taça caso os resultados originais tivessem sido mantidos, foi à Justiça para impedir a CBF de declarar o time paulista campeão, mas, depois, acabou recuando.

Blatter, porém, elogiou a forma como a CBF e as autoridades brasileiras agiram no caso. "Fizeram um trabalho muito bom e muito rápido", afirmou ele, que contou ter recebido a visita na sede da Fifa de um inspetor de polícia brasileiro para tratar da questão.

O dirigente falou ainda do êxodo de craques brasileiros para o exterior. Disse que não há como limitar o número de atletas negociados, mas que é possível controlar melhor o mercado. "É uma questão com a qual nos preocupamos e que está sendo discutida entre as confederações e a Corte Arbitral do Esporte."

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