Folha de S. Paulo


Sob risco de queda, presidente da Lusa pede ajuda e controla xingamentos

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Jorge Manuel Marques Gonçalves, 55, queria assistir ao jogo da Portuguesa contra o Mogi Mirim, em 21 de março, nas arquibancadas do estádio Romildo Ferreira. Foi aconselhado a ir para o camarote dos presidentes. Aceitou. Quando viu uma jogada bizarra em campo, se levantou para repetir o que fez nas cinco décadas anteriores, quando esse tipo de coisa acontecia: xingar a diretoria.

Saiu da cadeira e encheu os pulmões. Antes de o primeiro palavrão sair da boca, pensou:

"Mas agora a diretoria sou eu!"

Sentou-se calado.

Na presidência do clube desde a renúncia de Ilídio Lico, em 20 de março, o advogado, filho de dono de padaria, tem memória fotográfica sobre partidas e jogadores da Lusa. Acostumado a xingar, sabe que será xingado.

"Isso é bom. Mostra que as pessoas se importam. Pior seria a indiferença. A Portuguesa é uma paixão que muita gente se desiludiu. Estou disposto a ouvir sugestões e críticas, sem problema algum", disse ele, em entrevista para a Folha.

A pedido do próprio cartola, a conversa não aconteceu em uma sala fechada com ar condicionado. Foi nas arquibancadas do Canindé.

Advogado, Gonçalves caiu de paraquedas na presidência. Quando Ilídio saiu, o estatuto determinava que o substituto seria o vice-presidente jurídico. O advogado que ocupava o cargo estava brigado com o restante da diretoria.

Passou a ser responsável por honrar os contratos assinados por seu antecessor. Não teve acesso à maioria quando era diretor, embora fosse recomendável que isso acontecesse.

A folha de pagamentos atual gira na casa dos R$ 400 mil mensais. Um valor irrisório no futebol atual. Apesar disso, o clube sofre para manter as contas em dia. "A Portuguesa não consegue se manter com as próprias pernas. Precisamos de ajuda", reconhece.

Os débitos anteriores continuam. O zagueiro Valdomiro, por exemplo, tem sete meses a receber referente à campanha de 2014.

Na Série C no Brasileiro, a equipe pode ser rebaixada nesta quarta-feira no Paulista –dependendo de outros resultados, pode desde se salvar empatando até cair ganhando.

A equipe está na zona de degola do Paulista. Corre o risco de cair pela terceira vez em pouco mais de dois anos.

Gonçalves não diz exatamente com essas palavras, mas se sente meio desconfortável em cobrar pesadamente os jogadores que não vêm mostrando o desempenho desejado no Estadual.

"Quando eu conseguir cumprir a obrigação do clube, que é pagar em dia, vamos poder exigir mais coisas. A primeira obrigação é pagar em dia. Os jogadores estão ali porque os dirigentes os colocaram lá", confessa o presidente.

Apu Gomes/Folhapress
Presidente da Portuguesa, Jorge Manuel Marques Gonçalves, no Canindé
Presidente da Portuguesa, Jorge Manuel Marques Gonçalves, no Canindé

É uma opinião pouco usual para um cartola de futebol. Mas Gonçalves jamais imaginou que seria presidente. Entrou no clube como parte do que foi chamado de "chapão". A união de diferentes correntes políticas para a eleição no final de 2013. Pouco antes do caso Héverton. A escalação irregular do meia na última rodada do Brasileiro daquele ano fez a equipe ser rebaixada para a Série B e detonou a crise financeira e química que causou mais uma queda no ano seguinte.

O novo presidente não gosta sequer que o episódio seja chamado de "caso Héverton". Acha que o jogador não tem responsabilidade e sequer descarta que ele volte no futuro para o Canindé.

"Se nós precisarmos de um jogador com as características dele, por que não? O Héverton não tem culpa de nada".

O trabalho não é pequeno. Sob o risco de um novo rebaixamento, sem dinheiro para montar um novo elenco ou pagar as contas do clube e precisando resolver o que fazer com o Canindé, interditado desde o ano passado, o mandatário tenta olhar para o futuro. Conseguir uma parceria para o futebol profissional, outra para a base, restaurar a arranhada credibilidade do clube e achar patrocinadores...

"Eu preciso da ajuda daqueles que gostam da Portuguesa. Porque sei que a intenção de todos é melhorar a Portuguesa".

Uma das possíveis fontes de receita é fechar contrato com um grupo de empresas que reformaria o terreno do Canindé, construiria prédios de escritório e repassaria parte dos rendimentos para a Lusa. Uma negociação que já foi dada como certa, mas que Gonçalves vê apenas como uma possibilidade.

"É uma coisa embrionária. Não há nem o projeto de viabilidade econômica. Não tem contrato, não tem nada. Tudo precisa passar pelos órgãos deliberativos do clube. Não é algo para agora. Não é algo para este ano", confessa.

Até lá, Jorge Manuel Marques Gonçalves precisa apenas arrumar um jeito de fazer a Portuguesa renascer. Sem rebaixamentos.


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