Folha de S. Paulo


Portugal atrai 1,26 bilhão de euros com a 'venda' de vistos de ouro

O vice-primeiro-ministro de Portugal, Paulo Portas, não esconde seu apoio ao programa para atrair investidores ricos não europeus em troca de permissão de residência. O chamado "visto de ouro" levou, em dois anos, 1,27 bilhão de euros em investimentos para o país.

"Seria burrice se fechássemos essa porta, e outros países ganhassem esse dinheiro", afirmou.

Mais de 1.500 "vistos de ouro" foram emitidos em 2014. O maior número deles, de longe, foi para os chineses, seguidos de brasileiros e russos. O visto permite viver em Portugal e outros países signatários do Tratado de Schengen. O preço, no entanto, é alto. Aqueles que desejam a cobiçada autorização de residência da União Europeia para si e suas famílias têm que investir 500 mil euros no setor imobiliário.

Mas na cara Lisboa, isso é quase uma pechincha.

J. Moreno/Picture-Alliance/Arco Images
Prédios em Portugal; país concede visto de ouro para quem investir em imóveis de luxo
Prédios em Portugal; país concede visto de ouro para quem investir em imóveis de luxo

Chineses, em particular acostumados a pagar altos preços por apartamentos, não estão deixando de aproveitar essa oportunidade. Um grande número de apartamentos de luxo na capital portuguesa, ou em praias do exclusivo subúrbio de Estoril, está agora nas mãos de chineses.

Empresas portuguesas e chinesas estão focando em clientes ricos e oferecem pacotes completos, incluindo a solicitação de visto e até mesmo uma diarista portuguesa.

Nuno Durão, corretor de imóveis que oferece escritórios de alto padrão próximos ao glamouroso Casino Estoril, acha que a lei sobre o 'visto de ouro' é a melhor coisa que o governo fez para ajudar Portugal. "É simples e trouxe rapidamente investimentos para o país", afirma.

Durão vende de tudo o que é caro, de palácio a coberturas. Portugal, afirma ele, não é um país desenvolvido e é voltado ao turismo. Assim, o boom imobiliário está fazendo com que investidores ricos falem sobre Portugal, e a indústria da construção, que estava em crise, volte aos trilhos.

POLÊMICA

No entanto, a maioria não investiu os necessários milhões de euros na criação de empresas, como era inicialmente esperado. Em vez disso, eles compraram apartamentos luxuosos, segundo Sérgio Alves, secretário-geral da Câmara de Comércio Luso-Chinesa.

"O visto de ouro não levou a quaisquer investimentos na economia. Ele é usado exclusivamente para a compra de imóveis. A maioria dos chineses que compra nem sequer vive aqui de forma permanente", afirma Alves.

"Nós emitimos os vistos para pessoas cujas fontes de renda são desconhecidas", alerta João Semedo, que integra o partido esquerdista Bloco da Esquerda, que, assim como o Partido Socialista Português, é contra o programa.

A eurodeputada socialista Ana Gomes afirma que o programa de "vistos de ouro" de Portugal abriu uma porta para a Europa às organizações criminosas de lavagem de dinheiro. Ela pede que o governo pare com a prática.

O programa de "visto de ouro" foi interrompido algumas vezes, por exemplo, quando o chefe da polícia de imigração portuguesa e cerca de dez funcionários públicos, alguns deles em altas posições, foram presos por suspeitas de corrupção ao emitir vistos ilegais para estrangeiros ricos de fora da União Europeia.

Ainda não está claro quantos deles foram subornados e qual foi a quantia recebida para a emissão dos cobiçados passaportes. Mas o escândalo forçou o então ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, a se demitir.

DINHEIRO DUVIDOSO

João Semedo afirma que esses vistos são a porta de entrada para canalizar dinheiro de origem duvidosa na União Europeia. Por isso, seu partido está exigindo o fim da política de vistos e uma investigação cuidadosa do dinheiro investido. "Eles poderiam até mesmo vir de crimes econômicos", afirma Semedo.

O vice-primeiro-ministro não contesta as críticas, mas faz planos para facilitar o processo. Ele pretende diminuir a "taxa de adesão" para um investimento de 350 mil euros na modernização de prédios antigos, projetos de arte ou de ciência para obter a permissão de residência. Quem comprar em regiões subdesenvolvidas pode contar até mesmo um desconto de 20%.

A campanha para atrair estrangeiros ricos está mais acirrada, segundo Paulo Portas. "Ultimamente, estamos competindo com outros 13 países", diz. Mas o vice-primeiro-ministro prefere distribuir presentes a possíveis solicitantes duvidosos a assustar os ricos com exigências mais difíceis. Em relação à acusação de corrupção e crimes relacionados ao "visto de ouro", Paulo Portas diz apenas que os culpados vão enfrentar todos os rigores da lei.


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