Folha de S. Paulo


Nem crise econômica afeta 'verão de luxo' no litoral norte de São Paulo

Ao lado da piscina cheia de amigos, de convidados de última hora e de penetras, José Lucas Zanotti, 26, é taxativo: "Cara, para festa boa não existe crise". Ao menos nas casas "pé na areia" na praia de Maresias, em São Sebastião (SP), não mesmo.

Alugadas por valores que ultrapassam R$ 30 mil entre o Natal e o Ano-Novo, os imóveis recebem grupos de jovens dispostos a gastar –e a beber– o quanto puderem.

Bonitos, malhados, bem-nascidos ou bem-sucedidos, eles chegam em carros do ano, muitos deles importados, e querem fazer valer o investimento. "Aquelas meninas? Não sei quem são. Acho que viram a balada e foram entrando", diz, eufórico, um dos rapazes da casa.

Na praia mais concorrida do litoral norte paulista, Zanotti –dono de uma loja de conveniência no interior– calcula que ele e outros cinco amigos devem desembolsar R$ 40 mil em uma semana, R$ 22 mil só de aluguel.

Para eles, que repetem o esquema pelo quinto ano seguido, a recessão não chegou.

"No ano passado, demoramos e não conseguimos alugar esta casa, mas desta vez deu certo", diz. O grupo só não é maior do que nas férias passadas porque "uns caras começaram a namorar", afirma um dos convivas, aparentemente desapontado.

Ali, de onde se chega à praia só ao abrir a porta do quintal, eles aproveitam a vida no limite entre os que enfrentam a recessão e os que nem querem saber dela.

Quatro casas adiante, num sobrado de cinco quartos, a música eletrônica é ainda mais alta e a vibração é sentida na praia. Mas ainda não é uma festa de verdade, "só uma reunião" para uns 50 amigos, ressalta o anfitrião Tonny K, 32, analista de TI (e DJ nas horas vagas).

Festa mesmo, oficial, seriam três: a do Vermelho, a do Havaí e, lógico, a mais esperada, a da Virada –com queima de fogos, telões espalhados pelo quintal bem ao lado da piscina e pulseirinha de identificação para entrar.

"Hoje eles trazem tudo para as festas: DJ, bebida e até segurança", diz o promoter Ricardo Moraes, 40, morador de Maresias. Cerveja, vodca e outras bebidas, tudo corre por conta. "Assino embaixo. Não tem crise mesmo quando a festa é boa", diz Tonny.

Em um cenário de recessão, ele pondera, as pessoas podem até passar a escolher mais criteriosamente o tipo de diversão e o quanto irão gastar, mas a qualidade do que se oferece fala mais alto.

Não que eles tenham feito economia. "Ninguém passou fome para estar aqui hoje", diz o engenheiro Bruno Nicácio, 31, um dos 30 que desembolsaram R$ 1.200 para a semana na casa "open bar".

Quem também aproveita os bons ventos da temporada são os proprietários. O dono de uma das casas em Maresias, que pede para não se identificar, diz que a diária custa em torno de R$ 3.000.

Em relação ao mesmo período do ano passado, ele não nota queda. "Só demorou um pouco mais, mas agora estou com as datas preenchidas até o final de janeiro", afirma.

Difícil mesmo naquela faixa de areia disputada é conseguir dividir o tempo entre as festas nas casas e as baladas "oficiais".

Na última segunda (28), nem mesmo a forte chuva afastou cerca de 700 jovens de uma delas. Rapazes sem camisa e meninas de biquíni com pequenos pirulitos em forma de coração na boca lotavam uma boate. "O Brasil pode estar uma merda, mas não vai parar de fazer festa", diz Karina Lia Deconti, 35.

'FAROFA'

Bem em frente às festas que não têm hora para acabar e onde a crise não bateu, na praia de Maresias (litoral paulista), os barraqueiros dizem amargar queda de até 60% no faturamento.

Para além da recessão que encareceu produtos como a cerveja, os comerciantes reclamam da atitude dos banhistas, que, nos últimos anos, já não temem serem vistos como "farofeiros" e levam comida e bebida à praia.

"Eles trazem tudo hoje em dia. Ontem, tinha um grupo com 'hot dog'", diz a vendedora Marly Lima, 39, há 12 na praia. "A cada ano que passa parece que fica pior."

A saída para ela, que vende uma lata de cerveja por R$ 5 e uma caipirinha por R$ 15, foi segurar os preços e absorver o prejuízo. "Não fecho o dia com mais de R$ 900, porque ninguém quer levantar da cadeira e vir aqui pedir uma cerveja", queixa-se.

MAIS BARATO

Do outro lado dessa equação estão os banhistas. Nos grupos reunidos em Maresias, isopor e cooler são encontrados facilmente.

"Não tem comparação, é muito mais barato [levar comida à praia]", diz a estudante de relações públicas Stephanie Golovitei, 21.

"Acho que a gente acaba gastando apenas 30% a 40% do que gastaria se deixasse para comprar as coisas aqui", afirma o analista Thiago Braga, 32.


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