Folha de S. Paulo


Paralisação afeta cerca de um milhão de passageiros de ônibus em SP

A paralisação de motoristas e cobradores que fecha todos os terminais de ônibus municipais de São Paulo, na manhã desta quarta-feira (5), afeta cerca de um milhão de passageiros, segundo a prefeitura.

O ato é motivado pelo aumento dos ataques a ônibus –alvo de incêndios pela cidade desde 2013. O estopim foi a morte do motorista John Brandão, 40, em 22 de outubro, após ter 70% do corpo queimado em um ataque.

A previsão é que a paralisação seja encerrada ao meio-dia, segundo o sindicato da categoria.

No terminal do Jardim Ângela, na zona sul, os passageiros que chegam são pegos de surpresa pelo protesto.

"Ninguém sabia. Ninguém avisa nada", diz a dona de casa Neide do Carmo, 34, que estava com os dois filhos, um de 1 e outro de 7 anos. "Eu precisava ir até a Vila Prudente [zona leste]. Agora estou com medo de ir e, no meio do caminho, não conseguir voltar com meus filhos para casa".

"Agora vou ter que ligar para o meu chefe e dizer que não vou chegar a tempo", conta o administrador Cassio Souza, 23, que trabalha no Itaim Bibi, na zona oeste.

Débora Evelyn, 20, que trabalha como vendedora no shopping Ibirapuera, chegou a fotografar o terminal de ônibus paralisado para enviar a foto à sua chefe. "Tem que registrar pra justificar o atraso, né?".

Assim como muitos passageiros, Débora recorreu aos veículos de cooperativas, que não aderiram à paralisação, para seguir viagem. No terminal, esses coletivos saiam lotados.

O casal Marcos de Lima, 34, e Débora Lucas, 23, estavam a caminho do ultrassom de Débora, que está grávida de 8 meses, em Santo Amaro (zona sul). "A gente vai ter que pagar mesmo sem fazer o exame", lamenta o futuro pai.

Os dois costumam chegar ao terminal de ônibus para fazer uma baldeação. Nessa manhã, porém, o coletivo não passou em sua rua. "Tive de vir a pé mesmo", disse Débora.

MEDO

Entre os motoristas que cruzaram os braços está Rodrigo de Bruno, 35, que diz ter sofrido um ataque de criminosos enquanto dirigia um ônibus da linha 637A.

Ele conta que, em julho, uma moto com dois homens parou na frente do ônibus. "Na hora achei que fosse assalto, mas eles tiraram um galão de gasolina da mochila", diz ele.

Os criminosos subiram no coletivo, avisando que o incendiariam. Os passageiros saíram do ônibus e os homens despejaram o combustível nos fundos do veículo.

"Na hora, a gente não sabe o que vai acontecer. Não sabe se eles vão só assaltar a gente ou se vão fazer algo pior. A gente tem medo de morrer", conta.

Segundo Bruno, ele e o cobrador conseguiram conter o incêndio com a ajuda de outros motoristas e cobradores que passavam pela rua.

Fabrício Lobel/Folhapress
O motorista Rodrigo de Bruno, 35, disse ter sofrido um ataque de criminosos enquanto dirigia um ônibus
O motorista Rodrigo de Bruno, 35, disse ter sofrido um ataque de criminosos enquanto dirigia um ônibus

BOLETIM

A SPTrans, empresa da prefeitura que gerencia os ônibus, informou que irá registrar um boletim de ocorrência contra o sindicato da categoria por causa da paralisação.

"A reivindicação deles é justa, mas não precisa parar a cidade e prejudicar a população", disse Almir Chiarato, diretor de operações da SPTrans.

"É uma manifestação pela vida, e não pelo patrimônio. A população precisa se conscientizar de que queimar ônibus não resolve nada. Virou moda, queimar ônibus hoje é como queimar lixo", disse José Valdevan, presidente do sindicato dos motoristas.

Para minimizar os transtornos, a SPTrans afirma que diversas linhas estão sendo desviadas para evitar que os ônibus fiquem presos nos terminais. Os veículos estão mudando o ponto final para locais próximos de estações de metrô e trem.

Chiarato disse que, embora o horário da paralisação seja o de menor movimento no sistema, é possível que seus efeitos se estendam até o período da tarde, pois a normalização pode demorar.

O diretor afirmou ainda que a prefeitura vai aplicar multas às empresas de ônibus por todas as partidas que não forem cumpridas, com base nos registros dos GPS instalado nos coletivos.

O SP-Urbanuss (sindicato das empresas) diz que "apoia a causa", mas "não compactua com a paralisação".

TRÂNSITO

Além de afetar o transporte coletivo, a paralisação também causa impacto no trânsito, já prejudicado pela chuva.

Segundo a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), havia 89 km de lentidão às 11h, o que representa 10,3% dos 868 km de vias monitoradas. O índice está acima da média para o dia e horário (9,3%).

A Secretaria Municipal de Transportes afirma que está tomando "todas as medidas na tentativa de diminuir transtornos à população".

Foram acionados planos de emergência com ônibus reserva e a CET organizou um esquema de "monitoramento intensivo no trânsito em toda a cidade".

O Metrô e a CPTM informaram que estão operando com frota máxima nos horários de pico desta quarta e que composições reserva poderão ser acionadas, se necessário, durante a paralisação.

A prefeitura diz também que foi pedido à Polícia Militar um policiamento preventivo nos terminais, com apoio da Guarda Civil Metropolitana.

HORÁRIO

Inicialmente o protesto teria quatro horas de duração, mas foi reduzido, segundo o sindicato, após apelo da Secretaria da Segurança Pública.

Uma reunião com a pasta no fim da noite de terça decidiu que os trabalhadores integrarão uma comissão criada para tratar dos ataques a ônibus.

O governador Geraldo Alckmin (PSDB) disse na terça que a polícia está empenhada em descobrir e prender rapidamente quem participa dos ataques.

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RAIO-X DO TRANSPORTE COLETIVO

8.809
é a frota de ônibus das 14 viações em São Paulo

800
linhas de ônibus são operadas pelas empresas

4,5 milhões
de viagens são feitas por dia, em média, nos ônibus das viações

118
ônibus de empresas já foram incendiados em 2014, contra 53 no ano passado

37 mil
motoristas e cobradores de ônibus atuam em São Paulo

Fonte: SPTrans; SP-Urbanuss


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