Folha de S. Paulo


Aulas no Fartura defendem café e atacam 'imperialismo culinário'

O cardápio do segundo dia de aulas do festival Fartura foi bastante diversificado, com lições sobre café, cerveja, culinária caipira e plantas comestíveis.

Um dos destaques da tarde foi a barista Isabela Raposeiras, dona da premiada cafeteria Coffee Lab, em São Paulo. Para um público de cerca de 30 pessoas, ela defendeu que o café brasileiro tem muito potencial e vive um processo de valorização no mundo.

"Finamente as pessoas estão falando do café brasileiro de uma maneira diferente, melhor do que eu ouvia há muito tempo. Estão começando a considerar o Brasil um dos players mundiais de qualidade", afirmou, atribuindo a desvalorização dos grãos nos últimos tempos a "besteiras feitas com a exportação".

A barista também deu lições práticas para o público. Uma delas foi sobre como achar um café de boa qualidade. Segundo ela, aqueles do tipo 100% arábica e que mostram a fazenda de origem na embalagem são a melhor escolha. No entanto, disse que experimentá-lo antes da compra é fundamental.

Além disso, afirmou que o consumo de café de qualidade deve ser "quase uma obrigação" das pessoas. A justificativa, segundo ela, é o fato de ele ser mais prazeroso, ter um preço acessível e para "ajudar" aqueles que participam de seu complexo processo de produção.

Questionada a respeito das cápsulas de café expresso de marcas importadas, Isabela disse que os brasileiros deveriam consumir mais marcas de café cujo processo de torrefação foi realizado no país.

"Temos que empregar gente aqui, fazer com que o café que produzimos aqui não viaje. Isso também estimula o comércio direto entre o produtor e a pessoa que faz a torrefação, o que é mais justo, pois quem produz ganha mais", disse.

CULINÁRIA CAIPIRA

O sociólogo Carlos Alberto Dória, autor do livro "Estrelas no céu da boca", ganhador de um prêmio concedido pelo Gourmand World Cookbook Award, foi outra presença de destaque no Festival. O tema da aula foi a culinária caipira, típica do interior de São Paulo.

De acordo com Dória, esse tipo de culinária anda esquecida e tem sido desprezada pelos cozinheiros. Um dos motivos para isso, explicou, foi o processo de marginalização dos caipiras, inclusive na literatura, desde o fim do século 19.

"O caipira foi associado à pobreza, ignorância e doença. Essa marginalização foi tecendo essa rejeição simbólica e real ao seu universo pelas elites paulistas", afirmou.

Para o sociólogo, a maior dificuldade hoje é mudar a ideia das pessoas sobre a culinária caipira. "Nós queremos nos sentir descendentes de alemães, italianos, espanhóis. Não queremos nos sentir caipiras. As grandes cidades massacram o peso do interior. É o imperialismo culinário".

PLANTAS COMESTÍVEIS E CERVEJA

A engenheira de alimentos Kathia Zanatta, sócia do Instituto da Cerveja Brasil, e a professora do Senac Michele Coelho Novembre também participaram do Espaço Aulas.

Kathia destacou a crescimento do mercado de cervejas especiais no Brasil, enquanto o daquelas consideradas "mainstream" está caindo. Além disso, destacou que o consumo de cervejas nacionais está em crescimento, enquanto o das importadas, diminuindo.

Michele, por sua vez, falou sobre as principais espécies de plantas comestíveis e disse que ainda há pouca variedade de folhas à venda nos grandes centros. Porém, destacou que pequenos produtores começaram a "difundir e vender novas variedades" de plantas, contribuindo "para que possamos ter uma maior diversidade alimentar".

A colunista de gastronomia da Folha, Nina Horta, não pôde comparecer ao evento.


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