Folha de S. Paulo


Vender ou não vender: uma falsa questão

A Câmara Municipal de Salvador aprovou projeto de lei que proíbe a venda de cães e gatos em pet shops. O debate já tomou as redes sociais e deve chegar a outras cidades.

O autor do projeto, vereador Marcell Moraes (PV), diz que a intenção é coibir maus-tratos. Segundo ele, os animais ficam expostos em gaiolas pequenas, frias ou abafadas, e são oriundos de verdadeiras "fábricas de filhotes", nas quais os reprodutores são mantidos em péssimas condições.

Sou uma apaixonada por vira-latas e defensora incondicional da adoção de animais. Mas fico me perguntando em que medida banir a venda de filhotes em pet shops melhora, de fato, a situação dos bichos -única preocupação que deve nortear este debate, independentemente do bolso de quem quer que seja.

Ilustração Tiago Elcerdo

Pet shops são estabelecimentos com endereço fixo, passíveis de fiscalização e punição. Por que os vereadores não criam regras para melhorar as condições nesses locais?

Impedi-los de vender os bichos equivale apenas a riscar da cadeia produtiva a figura do intermediário, porque, enquanto houver consumidor, as tais fábricas de filhotes darão um jeito de escoar sua mercadoria. Será que cães e gatos ficarão em melhor situação nas feiras clandestinas, dentro de porta-malas?

Por fim, se há quem saiba que criadores funcionam sem condições mínimas, o que está esperando para denunciá-los ao poder público com seus nomes e endereços?

Por tudo isso, não vejo de que forma a proibição da venda de animais possa resultar em estímulo à adoção, como declarou o vereador. O tiro pode é sair pela culatra.

Estimular a adoção requer que se gaste tempo e dinheiro mostrando às pessoas a lotação dos abrigos, as mazelas do abandono e a necessidade de castrar e "microchipar" precocemente os animais --vendidos, adotados, doados... pouco importa. É hora de legislar a respeito da raiz do problema.


Endereço da página: