Folha de S. Paulo


Já comprou um COE hoje?

Marcos Santos/USP Imagens
Consumidor deve pesquisar antes de contratar crédito on-line, mas juros podem compensar
Consumidor deve pesquisar antes de contratar crédito on-line, mas juros podem compensar

COE é a sigla de um produto financeiro que está sendo vendido como se fosse pãozinho quente. Certificado de Operações Estruturadas, nome completo do COE, é um produto de alta complexidade, mas que, de repente, passou a compor a carteira "básica" de investimento de pequenos e médios investidores.

O argumento dos vendedores, que recebem altas comissões sobre a venda do produto, é que o investidor ganha no cenário favorável e não perde dinheiro no cenário ruim. Hum, dito assim, parece bom, mas é uma frase curta que conta só um pedacinho da longa história que envolve cada uma das engenhosas operações estruturadas criadas por instituições financeiras com o uso de derivativos.

Existem dois tipos de COE: 1) valor nominal protegido, com garantia do valor principal investido; ou 2) valor nominal em risco, em que há possibilidade de perda de até 100% do capital investido. A regra de "suitability", verificar se o investimento é adequado ao investidor, deve ser observada sempre.

O COE tem vencimento, valor mínimo de aplicação, indexador e cenário de ganhos e perdas definidos. Pode ser referenciado a diversas classes de ativos, tais como ações nacionais e internacionais, índices nacionais e internacionais, índices de preços, juros nacionais e internacionais e taxas de câmbio.

A instituição que emite e a que vende o COE devem garantir que as informações relativas à operação sejam de conhecimento e entendimento do investidor. A linguagem do informativo denominado "Documento de Informações Essenciais (DIE)" deve ser clara, objetiva e adequada a sua natureza e complexidade, de forma a permitir ampla compreensão sobre as condições de funcionamento, seus fluxos de pagamentos e os riscos incorridos. Devem esclarecer ainda que o recebimento dos pagamentos está sujeito ao risco de crédito do emissor do certificado, sem a proteção do FGC (Fundo Garantidor de Créditos).

Os COEs não são iguais, cada estrutura é diferente da outra. Não é um produto padrão como CDB, LCI, igual para todo o mundo, e só a cotação muda conforme o apetite do banco e o montante do investidor. Cada caso é um caso razão pela qual cada estrutura deve ser explicada e compreendida nos seus detalhes.

Mariana, por exemplo, comprou um COE pensando estar investindo em ações de grandes empresas americanas (Apple, Amazon, Disney e Netflix). O produto foi oferecido com o argumento de diversificação de carteira (renda variável), aplicação de R$ 5.000, compatível com a disponibilidade de Mariana. "Se as ações subirem, você ganha, se caírem, você não perde", disse o assessor.

Estratégia de cinco anos (cinco anos!) com dez datas de observação semestrais. Em cada uma das dez datas de observação (incluindo o vencimento), caso todas as quatro ações estejam iguais ou acima dos respectivos preços iniciais, ela recebe a taxa de juros predefinida mais o capital investido, e o COE é encerrado antecipadamente.

No vencimento, se a estrutura ainda não tiver sido encerrada e pelo menos uma das ações tiver apresentado queda, ela recebe o capital nominal investido. Atenção! Recebe apenas o capital investido, cinco anos depois, sem nenhuma remuneração.

Complicado afirmar que não há perda na operação. Supondo taxa de juros composta e estável de 7% ao ano, o investidor deixa de ganhar 40% do capital investido. Esse é o custo de oportunidade perdido pelo investidor. E a inflação acumulada em cinco anos não será desprezível.

Quanto Mariana pode ganhar? Nas datas de observação, se o preço das quatro ações estiver igual ou acima do preço do dia inicial, ela receberá a taxa definida no início da operação, de 8,75% ao semestre. Se o COE for encerrado antecipadamente, terá sido um bom negócio.

Se a condição não for alcançada (alta do preço de todas as ações), o COE não será encerrado e Mariana receberá o capital nominal investido no vencimento da operação. Sem remuneração. Não existe a possibilidade de resgatar a operação antes do vencimento. Sem liquidez.

Minha crítica não recai sobre o produto, mas sobre a maneira como tem sido negociado. O COE não é ruim, ele é o que é. Se bem negociado, pode ser positivo para todos os envolvidos: o banco que o estrutura e o emite, o agente comercial que distribui o produto e o principal participante da operação, o investidor.


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