Folha de S. Paulo


O desafio de fazer 'dreadlocks'

Muitos pais reclamam, ao trazer um cão para as crianças, de ficar com as partes pesadas da história, como passeio, recolher dejetos, dar banho. Os pequenos donos respondem somente pela hora de brincar.

No meu caso, herdei uma tarefa incomum por aqui: administrar a pelagem do Akos, nosso cachorro tupiniquim-magiar-jamaicano. Traduzo. Tupiniquim pois nasceu num canil brasileiro. Magiar porque é um puli, raça húngara. Jamaicano por carregar "dreadlocks" que lembram penteados de cantores de reggae.

Já relatei a aventura de Silvia, minha filha, para realizar o sonho de ter um puli.

Numa sucessão de coincidências, ela acabou ganhando o Akos.

Ilustração Tiago Elcerdo

Respirei aliviado quando soube que os "dreadlocks" se formam a partir do primeiro ano de idade. Como Akos desembarcou no sítio com meses de vida, teria ainda tempo de encontrar ajuda para a tarefa de deixar em ordem as cordas do pelame desabando de suas costas.

Primeiro, recorri à dona do canil. Ela até que nos passou indicações. Orientou-nos a ir separando os pelos, juntando-os manualmente para impedir embaraços e formar as cordas. Mas comecei a ensaiar uma onda de pânico quando percebi o tempo consumido pelo ritual de estética canina.

Roguei por mais ajuda. Tive a indicação de diversos profissionais que poderiam auxiliar. Peregrinei por pet shops e salões de estética canina. Colecionei negativas, sob os mais diversos argumentos, desde escassez de tempo à falta de coragem para enfrentar um novo desafio.

No final, minha insistência foi recompensada. Conheci William Galharde, especialista em estética canina. Expliquei-lhe não ter ambições de participar de exposições. Desejava apenas manter a pelagem sadia.

O profissional, com prêmios internacionais no currículo, não hesitou. Pegou Akos, colocou-o em cima da mesa e começou a desfazer nós e enrolar cordas.

Eu apenas observava, hipnotizado. Missão cumprida.


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