Folha de S. Paulo


Genoma profundo

SÃO PAULO - Está tudo nos genes. Pode ser, mas o problema é que não sabemos bem o que são genes. O velho conceito, segundo o qual genes são os trechos do DNA que codificam proteínas, que, por sua vez, fazem com que o organismo funcione, não para em pé. Em seu lugar, vai surgindo um modelo incrivelmente mais complexo. Tão complexo e cheio de novidades que nós, leigos, nos perdemos facilmente.

Quem quiser se achar já tem uma solução melhor do que fazer um curso de biologia molecular e tentar acompanhar os milhares de artigos que são publicados todos os meses nessa área. Pode ler "The Deeper Genome" (o genoma profundo) de John Parrington (Oxford).

Partindo da constatação de que o chamado DNA-lixo é tudo menos lixo –segundo o projeto Encode, pelo menos 80% das áreas do genoma que não codificam proteínas estão ativas e têm funções importantes nos processos biológicos–, Parrington nos guia através da nova constelação de mecanismos pelos quais nós, humanos, diferimos bastante de bananas apesar de partilharmos com elas 50% de nossos genes.

Ele explica –e de forma compreensível, o que é mais difícil– como vários tipos de RNA interferem na atividade do genoma, descreve o papel que a estrutura tridimensional da molécula de DNA desempenha nesse jogo e ainda fala dos transpósons e da epigenética, entre outros pontos.

Parrington encontra até espaço para algumas digressões literárias. Qualifica a epigenética, pela qual condições ambientais podem provocar alterações no genoma, como a vingança de Lamarck contra Darwin e lembra que quem descreveu com mais propriedade o papel das ferramentas na evolução humana foi Friedrich Engels. O cérebro humano evoluiu em consequência do uso de apetrechos, e não o contrário. Fazia tempo que eu não via alguém dizendo que o parceiro menos brilhante de Marx acertou numa questão crucial.


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