Folha de S. Paulo


Mezzo genes, mezzo ambiente

SÃO PAULO - Um dos mais polêmicos subprodutos da biologia é o debate sobre o peso dos genes e o do ambiente nas características humanas. Até algumas décadas atrás, o embate era essencialmente ideológico. Enquanto a esquerda apostava todas as suas fichas na maleabilidade das pessoas, cuja índole poderia ser melhorada através de obras de engenharia social, a direita advogava por uma espécie de natureza humana imutável e, em geral, meio ruinzinha.

À medida, porém, que dados empíricos foram surgindo –principalmente através de estudos que comparam pares de gêmeos monozigóticos (geneticamente idênticos) com dizigóticos (que partilham em média 50% do DNA)– as posições mais extremadas ficaram insustentáveis. As pesquisas mostravam que tanto a genética como o ambiente importavam para quase todas as características estudadas. Faltava apenas estabelecer com mais precisão o peso de cada um.

Não falta mais. Saiu há pouco na "Nature Genetics" uma grande metanálise que avaliou 2.748 estudos com gêmeos publicados nos últimos 50 anos, envolvendo nada menos do que 14.558.903 pares de irmãos e 17.804 características, e concluiu pelo empate. Considerados todos os traços, o grau de hereditariedade verificado, isto é, a parte atribuível aos genes, ficou em 49%.

Obviamente, isso significa que 51% de todas as características humanas que cientistas já se interessaram em medir podem ser tributadas ao ambiente. A má notícia para os fãs da engenharia social é que o ambiente compartilhado, isto é, fatores sobre os quais teríamos algum controle, como escola, atitudes dos pais etc., não parecem desempenhar um papel muito importante. Ao que tudo indica, bem mais relevante é o ambiente não compartilhado, que é uma grande nuvem de mistério que inclui desde elementos da vida intrauterina até as forças do acaso.


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