Folha de S. Paulo


Ciclovias vs. Cerveró

SÃO PAULO - O que teria levado Fernando Haddad (PT) a propor a eleição direta para subprefeitos em São Paulo? Por que abrir mão de poder em certas regiões da cidade, entregando-as a administradores eleitos pela oposição? Qual o sentido de iniciar uma polêmica sobre a constitucionalidade da medida?

Ou seria Haddad um líder maquiavélico, cujo objetivo é enfraquecer vereadores chantagistas retirando deles o poder de indicar subprefeitos em seus currais eleitorais?

O prefeito, professor de ciência política, tem algo de uspiano e sonhático em sua personalidade. Provavelmente acredite genuinamente que eleger subprefeitos é algo que fortaleça a democracia, e talvez até sonhe com o dia em que São Paulo vire, senão uma ágora ateniense, ao menos um simulacro de Suíça, onde votar em plebiscitos é mania nacional.

Mas é improvável que seja apenas a pequena Marina Silva que existe dentro de sua cabeça se manifestando. As diretas para subprefeito são mais um item na lista de inovações –para alguns, exotismos– que incluíram a pintura de faixas de ônibus, as ciclovias, as praças com internet grátis, a redução da velocidade nas marginais e a fracassada tentativa de proibir a venda de foie gras.

Quanto mais se fala nesses temas, menos se toca no que Haddad tem de mais frágil: as promessas de campanha não cumpridas, a falta de dinheiro, o escândalo em seu partido, o desastre econômico produzido por Dilma, sua aliada nominal.

Toda eleição municipal é uma mistura de temas locais e nacionais. Na deste ano, o pano de fundo da crise certamente terá mais peso que o habitual. Para ter alguma chance de reeleição, Haddad tentará desesperadamente falar de ciclovia, não de Cerveró. De eleição em subprefeituras, não de recessão. Quanto mais inusitado o tema, melhor.

Haddad precisa, em outras palavras, mudar de assunto, numa cidade que sente na pele as crises econômica e política. Boa sorte ao tentar.


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