Folha de S. Paulo


De Amador.Aguiar@com para J.Levy@gov

Estimado ministro,

O senhor foi o primeiro funcionário do Bradesco a se tornar ministro da Fazenda. Para o banco que fundei, isso é uma honra e, ao mesmo tempo, um risco. Não trabalhamos juntos. O senhor formou-se na Universidade de Chicago. Eu, em lugar nenhum.

Resolvi escrever-lhe por causa do contratempo que a Receita Federal, sob sua jurisdição, criou para os clientes com o cadastro dos empregados domésticos. Veja que eu uso a palavra clientes, pois os cidadãos pagam impostos para receber serviços. Chamando-os de contribuintes, falsificamos a essência da relação. Contribuinte é quem deixa dinheiro numa caixa de igreja. No banco, o senhor sabe, cobramos taxas em troca de serviços. O cliente é obrigado a pagá-las, e nós somos obrigados a servi-lo.

Em 1943, quando fundei o Bradesco, o brasileiro achava que entrar em banco era coisa de rico. Passei a receber contas de luz, abri agências em cidades que não tinham energia elétrica. A mesa do gerente deveria ficar perto da porta de entrada. Nossos funcionários ensinavam a clientela a preencher cheques. Um dos nossos bancários foi escolhido para a dirigir uma agência e, com a mulher, passou o fim de semana limpando os balcões e o chão. Ele viria a se tornar presidente do banco. Em apenas oito anos, o Bradesco tornou-se o maior do país.

No domingo passado (1º), ficou claro que o sistema do cadastro não funcionava. Eu sei o que é isso porque o Bradesco foi o primeiro banco brasileiro a usar computador. O senhor e o secretário da Receita não disseram uma palavra. Pareciam aqueles paulistas quatrocentões que competiam comigo.

Passaram-se o domingo e a segunda-feira. Nada. Na terça-feira (3), a Receita avisou que não prorrogaria o prazo para a regularização do cadastro: "Não trabalhamos com essa hipótese". O senhor foi a dois eventos e continuou calado.

Só na tarde de quarta-feira (4), a 72 horas do limite dado aos clientes para se cadastrarem sem multa, o senhor e a Receita fizeram o que deveriam ter feito na segunda. Não ouviram os clientes, mas ouviram a patroa e estenderam o prazo.

O senhor sabe como eu reagiria se, durante quatro dias, uma agência do Bradesco estivesse com uma máquina quebrada, uma enorme fila de clientes na sua porta e o gerente nada tivesse a dizer. Se a confusão do cadastro da criadagem tivesse acontecido no Bradesco, eu teria dispensado seus valiosos serviços.

Atenciosamente,
Amador Aguiar

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HAJA CONTROLE

Em 2010, Alexandra Mendes Marcondes, mulher do secretário de Governo do município do Rio de Janeiro, Pedro Paulo Carvalho, foi a uma delegacia e apresentou queixa contra ele por tê-la espancado, quebrando-lhe um dente.

O doutor é o herdeiro presuntivo do prefeito Eduardo Paes para a eleição do ano que vem. Em cinco anos, a polícia não se deu ao trabalho de ouvi-lo. Num depoimento posterior, Alexandra disse que inventou a história e retirou a acusação, apesar de existir um laudo do Instituto Médico Legal.

Na semana passada, Pedro Paulo confirmou o episódio, que atribuiu a um "episódio de descontrole nosso". Ou usou o plural majestático, ou seria um caso em que mulher se descontrola e leva uma surra. Estranho descontrole o do doutor. Ele bateu na mulher porque ela havia encontrado fios de cabelos compridos num ralo do banheiro e um sutiã alheio na cozinha.

O descontrole pessoal de Pedro Paulo é apenas um aspecto individual do problema. Há outro, e nele entra mais gente. A denúncia de uma surra numa mulher fica cinco anos parada na polícia e o agressor, uma autoridade pública, passa todo esse tempo fugindo do assunto. Isso não é coisa de descontrolado. Ao contrário, é coisa de quem tem muito controle e sabe exercê-lo, inclusive sobre os outros.

Ao reconhecer o espancamento, o doutor disse: "Aprendi muito com isso". Aprendeu a dizer a verdade depois de cinco anos.

A candidatura de Pedro Paulo à Prefeitura do Rio está a caminho do ralo, mas ele continua como secretário de Governo do doutor Eduardo Paes, que talvez não soubesse de nada.

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TROPA DE CHOQUE

O Bope do deputado Eduardo Cunha mostrou ao plenário da Câmara que tem um banco de dados onde estão dissecadas as doações recebidas por deputados e, sobretudo, a contabilidade dos seus gastos com dinheiro público.

Cada deputado tem direito a até R$ 45 mil mensais livres de impostos para gastos com passagens, moradia, gasolina, aluguel de carros e de escritórios ou mesmo almoços e jantares. Já houve caso de cobrança de despesa com um regabofe em motel.

A PETROMÃE

Coisas da Petrobras: Em 1996, Ishikawajima resolveu sair do Brasil e passou adiante seu estaleiro do Rio por uma quantia simbólica. Nele, estava o maior dique seco do país.

Anos depois, ele foi vendido por algo em torno de R$ 200 milhões, para serem pagos em 12 anos, com prestações pouco superiores a R$ 1 milhão mensais. Em 2006, parte do estaleiro foi arrendado pela Petrobras, que passou a pagar R$ 4 milhões mensais por vinte anos.

Em 2012, a Petrobras licitou a construção, no estaleiro, de quatro unidades marítimas para produzir petróleo, e a encomenda foi para um consórcio das empreiteiras Odebrecht, OAS e UTC. Um contrato de US$ 2,7 bilhões. Três unidades foram para a China.

A quarta deveria ser entregue em 2014. Se tudo der certo, fica pronta em maio de 2016.

A PAZ DE WAGNER

O chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, está costurando em silêncio um processo de pacificação interna, dentro do governo, e externa, conversando com um pedaço da oposição.

Melhoraram as coisas, porque há pouco tempo um ministro do Planalto procurou Fernando Henrique Cardoso e disse que era preciso conversar.

Com quem?

Com o senador Humberto Costa, respondeu o ministro.

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MORO PODERIA ACALMAR AS BRIGAS DA ZELOTES

Eremildo é um idiota e surpreendeu-se com as encrencas surgidas no Judiciário em torno da Operação Zelotes.

Ricardo Leite, o primeiro juiz que cuidou do caso, foi afastado em julho. Ele substituía o titular, lotado num gabinete do Superior Tribunal de Justiça, e seu trabalho foi criticado pelo Ministério Público. Ofendido, apresentou uma queixa-crime contra um procurador. No troco, dois procuradores entraram com um pedido para que Leite seja mantido longe da Operação.

Em setembro, a Zelotes foi para a mesa da juíza Célia Bernardes, que chegou com a faca nos dentes, botou dois grão-senhores na cadeia e autorizou uma diligência de busca e apreensão no escritório do filho de Lula.

O desencontro entre o magistrado e os procuradores começou em abril. Durante todo esse tempo (seis meses), o titular da Vara, doutor Vallisney de Souza Oliveira, continuou no STJ. Na semana passada, ele decidiu reassumir seu gabinete, e Célia Bernardes foi afastada.

Como Eremildo acompanha os trabalhos da Lava Jato e viu que em Curitiba trabalha-se em relativa harmonia, pensou em pedir ao juiz Sergio Moro uma avaliação do que está acontecendo em Brasília.


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