Folha de S. Paulo


Pelo menos num ponto, Pan e Olimpíada se espelham

A Olimpíada reúne a nata do esporte mundial, como deve ocorrer no ano que vem no Rio de Janeiro. Já o Pan, que está sendo disputado em Toronto, no Canadá, é uma competição de menor porte e de nível técnico bem inferior.

Não há argumento que sustente uma comparação entre esses dois eventos poliesportivos. Ambos, no entanto, têm uma exigência igualmente sensível e indispensável: o controle antidoping, que visa a igualdade de condições nas disputas para todos os participantes.

Talvez por isso o escocês Craig Reedie, 74, presidente da Wada (Agência Mundial Antidoping) e um dos vice-presidentes do Comitê Olímpico Internacional, tenha lançado um alerta sobre a Olimpíada do Rio em entrevista a Paulo Conde, enviado desta Folha ao Canadá para a cobertura do Pan.

Reedie foi direto ao ponto ao destacar que o doping deve ser uma prioridade do país-sede na caminhada para receber os Jogos Olímpicos. Ressaltou que poucas coisas destroem tanto o investimento e a preparação para um evento como a Olimpíada quanto o doping. Em outras palavras, uma sede olímpica precisa servir de exemplo na luta antidoping.

No momento, a ABCD (Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem) corre contra o tempo para aprimorar o funcionamento do LBCD (Laboratório Brasileiro de Controle de Dopagem), recredenciado pela Wada em maio último, após o susto da perda dessa condição em 2013. Naquela oportunidade, falhas comprometedoras foram observadas.

O LBCD está encarregado dos testes antidoping na Olimpíada. O governo federal bancou R$ 188 milhões para a construção das novas instalações e compra de equipamentos daquele centro de exames, que pertence ao Instituto de Química da UFRJ (Universidade Federal do Rio).

O laboratório prepara pessoal para atuar durante os Jogos –também deve receber reforços do exterior–, projeto que contempla mais de 5.000 testes. Nos preparativos neste segundo semestre, segundo Marco Aurélio Klein, secretário nacional para a ABCD, cerca de 1.800 exames estão previstos em eventos-teste da Olimpíada no Rio e também fora de competição, situação na qual atletas recebem, sem aviso prévio, visita de equipes de coleta. Outros 500 já aconteceram desde o início do ano.

Sobre os procedimentos do antidoping no Pan, Klein alega que não pode comentar nada, porque é convidado e as disputas estão em andamento. Apenas elogia o trabalho dos canadenses. Como observador, está de olho nos detalhes. O Canadá realiza coleta de material para os testes em cerca de 35 estações, distribuídas pelos locais de competição. Elas são uma referência para os brasileiros nos preparativos para a Olimpíada.

Apesar da expectativa de redução dos casos de doping dos seus atletas e na condição de anfitrião dos Jogos de 2016, o Comitê Olímpico do Brasil e as confederações esportivas nacionais das modalidades têm se deparado com resultados positivos em exames de controle.

No Pan, até o último fim-de-semana, seis flagrantes de doping haviam sido revelados pela mídia, um deles do brasileiro Patrick Mendes, que ficou em quarto lugar no levantamento de peso na categoria até 105 kg. O teste de Mendes deu positivo para um tipo de testosterona proibido pelos regulamentos, mas o atleta ainda tem o direito à contraprova, uma chance de reverter o resultado.

Antes do Pan, Nayara Furtado e Kyssia Cataldo, remadoras brasileiras convocadas para competir no Canadá, também caíram na malha antidoping e perderam suas vagas na delegação. A incômoda situação foi um repeteco para Cataldo, que havia ficado fora de Londres-2012 pelo mesmo motivo.

O sonho de muitos atletas com o pódio não tem limites. O doping dá medalha quando a burla passa despercebida, mas tira quando é descoberta, além de acarretar punição e aborrecimentos. Hoje o sangue de um atleta é armazenado por dez anos, quando volta a ser testado por novas tecnologias. O controle antidoping obedece a um padrão, que o Pan e a Olimpíada seguem sem pestanejar. Nesse quesito até se equiparam, mas apenas nele.


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