Folha de S. Paulo


Tomara que Dilma tenha razão

Depoimento de testemunha ocular: a presidente Dilma Rousseff não parecia particularmente abalada pelo escândalo da Petrobras quando deu uma entrevista coletiva em um intervalo das sessões do G20, no domingo (16), em Brisbane.

É óbvio que sabia que o tema das perguntas seria o escândalo, não o G20 e as iniciativas anunciadas pelo grupo naquele mesmo dia.

Os jornalistas que cobríamos o evento temíamos até que ela usasse a introdução que geralmente o entrevistado faz nessas ocasiões para comer o tempo destinado às perguntas propriamente ditas.

Temíamos até que dissesse que questões sobre temas brasileiros ela só trataria no Brasil.

Nada disso aconteceu. Quando saiu a primeira pergunta –e era, claro, sobre o escândalo –, Dilma respondeu com firmeza, sem gaguejar e sem enrolar-se no idioma, como muitas vezes aconteceu nos debates na campanha eleitoral.

Em todos os momentos, ela demonstrou que pretendia tirar dela o foco do escândalo.

Primeiro, com a alegação, já um clássico, de que só há escândalo porque há investigação, ao contrário do que ela diz que ocorria em governos anteriores.

Segundo, ao não responder a dois questionamentos diretos: qual o efeito sobre ela própria que poderia ter o escândalo e se assumia a responsabilidade política por ele.

Afinal, como lembrado em uma das perguntas, ela havia sido presidente do Conselho de Administração da Petrobras.

Mais ainda: a presidente deu o que os especialistas em marketing chamam de "spin", torcer um fato para extrair dele um lado positivo.

O "spin": dizer que nunca mais o Brasil será o mesmo após a Petrobras porque acabou a impunidade.

Daí que resulta que o prejuízo político advindo do escândalo só ocorrerá se a frase provar-se falsa.

A maioria dos comentaristas que li depois da coletiva mostrou-se cética sobre isso, para dizer o mínimo.

Mas há nesse escândalo específico um fato novo: pela primeira vez, até onde minha memória alcança, estão sendo presos supostos corruptores, não apenas corruptos (estes confessos).

Quantas vezes você aí não sentiu inveja dos EUA, por exemplo, ao ver poderosos na cadeia por escândalos semelhantes? Pois é. Mas, para que a frase da presidente não seja mero "spin", é preciso que haja de fato punições no fim do percurso e, acima de tudo, a devolução do dinheiro desviado.

Só assim, corruptores em potencial sentir-se-ão menos tentados a agir, e o Brasil terá mudado.

A "Economist", em sua edição chamada de "expressa", lembra que, nos 13 anos em que é crime no Brasil praticar "insider trading", ninguém foi punido.

Trata-se de um mecanismo em que o portador de informação privilegiada usa-a para lucrar com ações.

Se um crime menos lesivo ao patrimônio público que o da Petrobras passa impune, como acreditar que a presidente tem razão?

Mas, se tiver, será melhor para o país do que para ela própria, que tem de lidar, além do escândalo, com um nó econômico que, esse sim, não pode afastar de seu colo.


Endereço da página: