Folha de S. Paulo


Você realmente tem consciência de todas as suas decisões?

Quem nunca ouviu falar naquela velha tática publicitária de colocar imagens de pipoca estourando na panela e um copo de refrigerante bem gelado antes do início de um filme no cinema? Em seguida, um lanterninha passa estrategicamente entre as fileiras vendendo as delícias quentinhas e calóricas, que esgotam em um piscar de olhos.

Obviamente nós já podemos imaginar que o resultado jamais seria o mesmo se a venda fosse feita sem o estímulo da propaganda, em um momento em que o público estivesse com a atenção totalmente focada no filme.

Mas será que esses efeitos associativos acontecem somente em situações óbvias como essa? A resposta é não. Na verdade, várias associações mentais que fazemos acontecem de forma bem silenciosa e têm um impacto poderoso em nossas vidas.

O ambiente no qual você está, as imagens que observa, os sons que são direcionados a você, entre 'n' outras impressões que o contexto pode lhe oferecer interferem em suas atitudes, decisões e comportamentos. O nosso corpo se expressa por influência das impressões que recebemos do mundo.

Na maioria dos casos, é difícil entender o que nos motiva a tomar determinadas decisões que podem parecer aleatórias, mas isso acontece em função daquilo que age em nosso inconsciente.

Para que fique claro o raciocínio, fica o convite para fazer um experimento que pode parecer um pouco desconfortável. Mas fiquem tranquilos, é um desconforto passageiro. Pense por alguns segundos naquilo que mais lhe dá nojo. Pode ser a imagem de um inseto pegajoso, imaginar-se mexendo em algo muito podre ou qualquer coisa parecida. Se a imagem que lhe veio à memória tiver sido muito forte, involuntariamente você deve ter contorcido o rosto ou mesmo arrepiado os pelos do braço.

Essas respostas instantâneas e involuntárias são os estímulos que seu corpo recebe em resposta a uma situação adversa, ainda que ela seja somente imaginária. É como se você se antecipasse a um acontecimento ruim.

Ainda sobre as impressões que temos, o psicólogo Daniel Kahneman fala sobre um experimento feito com um grupo de pessoas. Parte delas era orientada a mentir por telefone, enquanto outras mentiam por e-mail. Na sequência, elas deviam escolher entre dois produtos que lhe despertavam maior interesse, antisséptico bucal ou sabão. Aquelas que mentiram por telefone optavam pelo antisséptico, enquanto as outras preferiam o sabão. A ideia de "limpeza" estava associada às partes do corpo usadas para mentir, uma associação inconsciente do que representa a culpa.

Tendo em vista tudo que falamos, fica mais evidente o efeito de impressões em questões muito mais amplas do que o mero exemplo da pipoca e o refrigerante antes do cinema. Um estudo realizado nos Estados Unidos mostrou que as pessoas tendiam a votar a favor de medidas pró-escolares quando as urnas de votação eram colocadas dentro de uma escola.

Transfira isso para a nossa realidade política. Como você imagina que as belas propagandas feitas pelos candidatos realmente agem em seu inconsciente tendo em vista o poder das associações mentais? Carregamos o estereótipo de possuirmos memória curta. As notícias negativas envolvendo corrupção ou irregularidades envolvendo o político A ou B ao longo de quatro anos são suavemente dissolvidas entre imagens incessantes de apertos de mão, sorrisos largos, interações com a população mais carente, visitas a grandes obras com um capacete de proteção na cabeça.

Transponha as situações mencionadas neste texto para diferentes contextos de sua vida. Pense na associação mental que seu cliente vai fazer se você se reunir com ele mal humorado, depois de ter passado a noite discutindo com seu marido ou mulher. Perceba a importância de chegar a uma entrevista de emprego com um belo sorriso no rosto, como forma de despertar a receptividade do entrevistador. Nossas impressões pregam peças no pensamento consciente. O exercício de identificar essas "pegadinhas" pode nos ajudar a tomar decisões cada vez mais acertadas em nossas vidas.

Post escrito em parceria com Karina Alves, editora do site Finanças Femininas


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