Folha de S. Paulo


O amigo oculto do presidente

BRASÍLIA - Num discurso famoso, a presidente afastada disse que atrás de toda criança existe uma figura oculta, que é o cachorro. Nos últimos dias, os brasileiros estão percebendo que atrás do presidente interino existe outra figura, nem tão oculta. É o Eduardo Cunha.

Mesmo afastado da Câmara por decisão do Supremo, o correntista suíço está dando as cartas no governo de Michel Temer, seu velho aliado. Emplacou o advogado na Casa Civil. Emplacou um assessor na Secretaria de Governo. Emplacou um aliado como ministro dos Transportes.

Ajudou a emplacar outro advogado como ministro da Justiça. O escolhido vai comandar a Polícia Federal, que investiga políticos suspeitos de corrupção. Alguém pensou em conflito de interesses?

Agora Cunha deu a demonstração definitiva da ascendência sobre Temer. Emplacou André Moura, o mais fiel de seus escudeiros, como líder do governo na Câmara. Ele terá carta branca para negociar e dar entrevistas em nome do presidente.

Investigado na Lava Jato, Moura tem um prontuário de dar inveja ao padrinho. É réu em três ações penais no Supremo, sob acusação de desviar verba. Responde a mais três inquéritos, um deles por tentativa de homicídio. Foi condenado por improbidade após torrar dinheiro público para promover um churrasco.

Filiado ao nanico PSC, o deputado gosta de ser chamado de André Cunha, tamanha a intimidade com o chefe. O petista Paulo Teixeira o batizou com outro apelido: "lambe-botas". As botas de Cunha, é claro.

A escolha indignou até deputados que apoiaram o impeachment. Jarbas Vasconcelos, do PMDB, definiu a nomeação como "um escárnio".

Ao promover o pau-mandado, Temer se apresenta ao país como um refém de Cunha. Se ele pretende terceirizar o governo ao correntista suíço, deveria entregar logo as chaves do palácio. Questionado sobre os processos, Moura disse não ter "nada a temer". É verdade. Nós é que temos.


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