Folha de S. Paulo


Com reforma do Judiciário, Kirchner quer 'controle total', diz oposição

A proposta da presidente da Argentina, Cristina Kirchner, para reformar o Judiciário foi duramente criticada pela oposição e especialistas em direito.

Na última segunda-feira, a presidente anunciou um pacote de seis projetos de lei para "democratizar a Justiça", e na quarta-feira (10), em protesto, a oposição não compareceu ao primeiro debate das medidas no Congresso Nacional.

O argumento dos opositores foi o de que a reforma será aprovada "como quer o governo", que conta com maioria dos votos no Parlamento.

"O governo não nos ouve, não aceitará uma vírgula de mudança nos textos e aprovará essa medida, por seu desejo de ter o controle de todos os poderes do país", disse o senador Ernesto Sanz, do partido opositor União Cívica Radical (UCR).

As declarações dos opositores, em um dos salões do Congresso, foram transmitidas ao vivo por algumas emissoras de televisão. Sem a oposição, em poucas horas a bancada governista, reunida na Frente para a Vitória (FPV), apoiou as primeiras medidas que deverão começar a ser votadas na próxima quarta-feira, no plenário, segundo a imprensa local.

"Reforma 'Express'", escreveu o jornal "Clarín" --crítico do governo-- em sua edição online.

Os projetos de lei incluem a reforma no chamado Conselho da Magistratura, responsável pela seleção e controle dos juízes, cujos integrantes passariam a ser eleitos por voto popular.

O pacote prevê ainda a criação de três novas câmaras de cassação judicial e a imposição de limites para recursos, como os que têm sido usados pelo grupo Clarín para reagir à chamada Lei de Audiovisual (que restringe a participação de empresas no setor de mídia).

O ministro da Justiça, Julio Alak, justificou o pacote de reforma do Judiciário dizendo que ele contribuirá para fortalecer a democracia no país.

"Queremos ter um Judiciário mais eficiente, que resolva os litígios com maior rapidez e as questões de que os cidadãos comuns reclamam diariamente", afirmou o ministro diante das câmeras de televisão. "A conquista da democracia nunca foi fácil em nenhum país da América Latina, incluindo a Argentina".

A ideia foi rejeitada pelo especialista em Constituição Daniel Sabsay. "A reforma não contribui para a democracia. Ao contrário, aumentará o peso do governo nas decisões (da Justiça)", disse, à rádio Mitre.

"Ao criar novas instâncias, o governo estará reduzindo o papel da Suprema Corte, que tem atuado com grande independência. Além disso, o voto popular (que elegerá o novo Conselho da Magistratura) não parece que será transparente, já que os nomes dos candidatos acabará saindo em uma lista comum com candidatos a legisladores."

POLÊMICAS

A reforma vem se somar a outros temas que têm gerado divergências entre governo e oposição, a começar pelo debate sobre as contestadas medições de índices de inflação e de preços.

O governo passou a multar economistas que divulgam dados paralelos do indicador, e parlamentares da oposição passaram a informar o número mensalmente. O percentual paralelo costuma ser até mais de duas vezes maior que o oficial, do INDEC (equivalente ao IBGE).

A polêmica em torno da reforma do Judiciário surge também quando o governo aplica medidas para tentar conter a inflação, como o congelamento de preços dos combustíveis durante seis meses. "Congelaram preços dos alimentos e agora congelam preços dos combustíveis. Já vimos medida assim na Argentina. Só servirão para gerar mais inflação", afirmou o ex-ministro da Economia, Martín Lousteau.


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